Entre cristãos afeitos a avivamentos tenho ouvido este ditado: "Os avivamentos nascem depois da meia-noite".
É um provérbio que, embora não inteiramente verdadeiro, se tomado ao pé da letra, aponta para algo bem verdadeiro.
Se entendemos que esse
ditado significa que Deus não ouve a nossa oração por avivamento, se for
feita durante o dia, evidentemente não é verdadeiro. Se entendemos que
significa que a oração que fazemos quando estamos cansados e exaustos
tem maior poder do que a que fazemos quando estamos descansados e com
vigor renovado, outra vez não é verdadeiro. Certamente Deus teria de ser
muito austero para exigir que transformemos a nossa oração em
penitência, ou para gostar de ver-nos impondo-nos punição a nós mesmos
pela intercessão. Traços destas noções ascéticas ainda se encontram
entre alguns cristãos evangélicos, e, conquanto esses irmãos sejam
recomendados por seu zelo, não devem ser desculpados por atribuir
inconscientemente a Deus algum vestígio de sadismo indigno até dos seres
humanos decaídos.
Contudo, há considerável
verdade na ideia de que os avivamentos nascem depois da meia-noite,
pois os avivamentos (ou quaisquer outros dons e graças espirituais) só
vêm para os que os desejam com angustiosa intensidade. Pode-se dizer sem
reserva que todo homem é tão santo e tão cheio de Espírito como o
deseja. Ele não pode estar tão cheio como gostaria, mas com toda a
certeza está tão cheio como deseja estar.
Nosso Senhor colocou
isto fora de discussão quando disse: "Bem aventurados os que têm fome e
sede de justiça, porque serão fartos". Fome e sede são sensações físicas
que, em seus estágios agudos, podem tornar-se verdadeira dor. A
experiência de incontáveis pessoas que procuravam a Deus é que, quando
os seus desejos se tornaram dolorosos, foram satisfeitos repentina e
maravilhosamente. O problema não consiste em persuadir Deus a que nos
encha do Espírito, mas em desejar a Deus o suficiente para
permitir-Lhe que o faça. O cristão comum é tão frio e se mostra tão
contente com a sua pobre condição, que não há nele nenhum vácuo de
desejo no qual o bendito Espírito possa derramar-se em satisfatória
plenitude.
Ocasionalmente aparece
no cenário religioso alguém cujos anelos espirituais insatisfeitos vão
ganhando tanto volume e importância em sua vida, que expulsam todos os
outros interesses. Tal pessoa se recusa a contentar-se com as orações
seguras e convencionais dos enregelados irmãos que "dirigem em oração"
semana após semana e ano após ano nas assembleias locais. Suas
aspirações a levam longe e muitas vezes o tornam incômodo. Seus irmãos
em Cristo, perplexos, sacodem a cabeça e olham uns para os outros com ar
de entendidos, mas, como o cego que clamou por sua vista e foi
repreendido pelos discípulos, "ele, porém, cada vez gritava mais".
E se não tiver ainda
satisfeito as condições, ou se houver alguma coisa impedindo a resposta à
sua oração, poderá prosseguir orando até as horas tardias da noite. Não
a hora da noite, mas o estado do seu coração é que decide o tempo da
sua visitação. Para este irmão bem pode acontecer que o avivamento venha
depois da meia-noite.
Todavia, é muito
importante que nós compreendamos que as longas vigílias em oração, ou
mesmo o forte clamor e as lágrimas, não são em si mesmos atos
meritórios. Toda bênção flui da bondade de Deus como de uma fonte. Ainda
aquelas recompensas das boas obras sobre as quais certos mestres falam
tão servilmente, sempre em contraste agudo com os benefícios recebidos
somente pela graça, no fundo são tão certamente de graça como o próprio
perdão do pecado. O mais santo apóstolo não pode ter a pretensão de ser
mais que um servo inútil. Os próprios anjos subsistem graças à pura
bondade de Deus. Nenhuma criatura pode "ganhar" nada, no sentido comum
da palavra (de trabalhar para ganhar ou de receber por merecimento ou de
adquirir pagando). Todas as coisas pertencem à bondade soberana de Deus
e por ela nos são dadas.
A senhora Juliana
resumiu lindamente isso quando escreveu: "Honra mais a Deus, e O agrada
muito mais, que oremos fielmente a Ele por Sua bondade e nos apeguemos a
Ele por Sua graça, e com verdadeiro entendimento, permanecendo firmes
por amor, do que se empregássemos todos os recursos que o coração possa
imaginar. Pois se usássemos todos os recursos, seria muito pouco, e não
honraria plenamente a Deus. Mas em Sua bondade, a ação é mais que
completa, faltando exatamente nada... Pois a bondade de Deus é a oração
mais elevada, e desce às partes mais fundas da nossa necessidade".
Apesar de toda a boa
vontade de Deus para conosco, Ele não pode atender aos desejos do nosso
coração enquanto os nossos desejos não forem reduzidos a um só. Quando
tivermos dominado as nossas ambições; quando tivermos esmagado o leão e a
víbora da carne, e calcado o dragão do amor próprio sob os nossos pés, e
nos considerarmos verdadeiramente mortos para o pecado, então, e só
então, Deus poderá elevar-nos à novidade de vida e encher-nos do Seu
bendito Espírito Santo.
É fácil aprender a
doutrina do avivamento pessoal e da vida vitoriosa; é coisa
completamente diversa tomar a nossa cruz e afadigar-nos na escalada do
sombrio e áspero morro da renúncia. Aqui muitos são chamados, poucos
escolhidos. Para cada um que de fato passa para a Terra Prometida,
muitos ficam por um tempo, olhando ansiosamente através do rio e depois
retornam tristemente à segurança relativa das vastidões arenosas da vida
antiga.
Não, não há mérito nas
orações feitas a desoras, mas requer disposição mental séria e coração
determinado deixar o comum pelo incomum no modo de orar. A maioria dos
cristãos nunca o faz. E é mais que possível que as poucas almas que se
empenham na busca da experiência incomum cheguem lá depois da
meia-noite.
Por A. W. Tozer
Extraído do livro "O Melhor de A. W. Tozer"
Fonte: http://ministeriobbereia.blogspot.com


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