Mesmo antes da Queda, Deus instituiu o descanso
semanal (Gênesis 2.1-4). O sétimo dia foi observado pelo povo do Senhor mesmo
antes do Sinai (Êxodo 16.23), foi incluído entre os preceitos do Decálogo como
um lembrete da Criação (Êxodo 20.8-11) e da Redenção (Deuteronômio 5.12-15). O
quarto mandamento foi exposto pelos profetas como um dia de descanso (Isaías
58.13-14) e o povo, após o exílio, comprometeu-se pactualmente em observá-lo
(Neemias 13.15-22).
Antes da ressurreição do nosso Senhor, Jesus observou o sábado no sétimo dia (Lucas 4.16), e assim também faziam os cristãos (Lucas 23.54-56). Então, Cristo ressuscitou no primeiro dia (Marcos 16.9), fez do domingo um dia de reunião com seus discípulos (Marcos 16.9-11; Mateus 28.8-10; Lucas 24.34; Marcos 16.12-13; João 20.19-23). No domingo, Cristo abençoou seus discípulos (João 20.19), soprou sobre eles o Espírito (João 20.22), ordenou-lhes a grande comissão (João 20.21), ascendeu aos céus (João 20.17) e em um domingo derramou o Seu Espírito sobre a Igreja no Pentecostes (Atos 2.1).
Com tantas demonstrações, a Igreja entendeu que Cristo havia mudado o dia de descanso do sábado para o domingo e, então, fez do Domingo o seu dia de culto (Atos 20.6-7; 1 Coríntios 16.2). No primeiro dia da semana, Cristo entregou sua última grande revelação à Igreja que já reconhecia o domingo como o Dia do Senhor (Apocalipse 1.10). A partir de então, o domingo passou a ser recebido pelos cristãos como o “sábado cristão”, ocupando um lugar especial na fé da Igreja desde a patrística até os símbolos reformados.
Assim, é estranho que um mandamento que tenha tido lugar desde a Criação, que tenha recebido o testemunho da Lei e dos Profetas, que foi restabelecido depois do exílio, observado por Cristo e os apóstolos e que continuou a ser observado pela Igreja ao longo da História, seja hoje tão atacado e negligenciado. Os argumentos contra o Domingo são de naturezas diversas, vem de dispensacionalistas que advogam a abolição da Lei, de sabatistas que negam a mudança do sábado para o domingo e de outros que pensam ter a Igreja adotado o primeiro dia da semana como dia de culto por mera convenção. Objetaremos contra alguns argumentos que têm sido levantados contra a obrigatoriedade da guarda do Domingo:
Objeção 1: A Lei foi abolida (Efésios 2.15). Cristo cumpriu a Lei em nosso lugar, desse modo, estamos desobrigados da observância do quarto mandamento.
Resposta: É verdade que o cristão não está debaixo da Lei como um Pacto de Obras, e nesse sentido, é correto dizer que a Lei foi abolida. Mas a observância da Lei ainda é obrigatória para o cristão como um meio do qual Deus faz uso para a santificação dos seus filhos. É nesse sentido que Cristo declara que a Lei não pode ser abolida (Mateus 5.17-18) e que o apóstolo Paulo afirma expressamente que a Lei não foi anulada (Romanos 3.31). É verdade que Cristo obedeceu a Lei Moral em nosso lugar como Pacto das Obras para nossa justificação e assim nós não temos que guardar a Lei para sermos justificados (Gálatas 2.16), mas isso não significa que não estejamos obrigados a obedecer a Lei divina para nossa santificação. Além disso, a Lei da qual fala Efésios 2.15 é a Lei na forma de ordenanças e mandamentos que separava judeus e gentios, isto é, a Lei cerimonial. A Lei cerimonial do Antigo Testamento foi revogada com a morte de Cristo, mas a Lei moral permanece irrevogável.
Objeção 2: O quarto mandamento é de natureza cerimonial (Levítico 23.3) e foi abolido como as demais cerimonias do judaísmo (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10).
Resposta: Embora o Antigo Testamento fale de sábados cerimoniais, que até mesmo poderiam cair em um dia que não fosse o sétimo (Levítico 23.3,11,15,16,32,38) e, ainda que o Novo Testamento ensine que esses sábados cerimoniais tenham sido abolidos juntamente com os demais dias de festividades judaicas (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10), esse sábado cerimonial deve ser distinguido do sábado moral. Enquanto os sábados cerimoniais são apresentados nas Escrituras ao lado das festividades judaicas (Oséias 2.11), o sábado moral é apresentado no contexto dos mandamentos morais. Ele é incluído como um mandamento criacional e um dos princípios morais do Decálogo.
Que todos os mandamentos do Decálogo são de natureza moral, isso fica claro: (i) pela própria natureza dos mandamentos que estão gravados na consciência de todos os homens e que se manifestam em todas as culturas; (ii) porque os profetas sempre que denunciam os pecados do povo fazem isso expondo algum mandamento do Decálogo; (iii) porque Cristo resumiu a Lei Moral tendo em mente as duas tábuas do Decálogo: amar a Deus (primeiro ao quarto mandamentos) e amar ao próximo (quinto ao décimo mandamento) – Mateus 22.35-40; (iv) porque os apóstolos receberam os dois grandes mandamentos de Cristo sobre o amor como um resumo dos mandamentos do Decálogo (Romanos 13.9); (v) porque Cristo apresentou o Decálogo ao jovem rico como o código perfeito de Deus que se integralmente obedecido garantiria a posse da vida eterna (Marcos 10.17-19); (vi) porque a Igreja, iluminada pelo Espírito, em suas mais variadas vertentes, sempre recebeu o Decálogo como a exposição fiel da Lei moral de Deus, dando a ele um lugar especial em seus símbolos de fé.
Visto que o Decálogo é um resumo da Lei Moral de Deus, o quarto mandamento que ordena a guarda do sábado não pode ser um preceito cerimonial distinto dos outros nove. Além disso, o sábado foi instituído antes da Queda (Gênesis 2.1-4), antes, portanto, que se pudesse estabelecer qualquer preceito cerimonial. Sendo anterior à Queda, o sábado não pode ser da mesma natureza daqueles princípios cerimoniais que fazem parte dos rituais de expiação do Antigo Pacto. Assim, visto que o quarto mandamento é moral, sua obediência permanece obrigatória a todos os homens tanto quanto os demais mandamentos do Decálogo.
Há quem admita que o quarto mandamento seja um preceito moral e que sua observância continue em nossos dias, mas afirmam que ele não mais se refere à observância de um dia. Ensinam que cumprimos o quarto mandamento, hoje, simplesmente por descansarmos nossa salvação em Cristo ou por separarmos todos os dias um momento de descanso e dedicação a Deus. Mas se isso é assim, não haveria necessidade do quarto mandamento. Se não houvesse o quarto mandamento, a Igreja continuaria descansando sua salvação em Cristo e ainda estaria obrigada pela Lei a cultuar a Deus e repousar diariamente. Além disso, mesmo com o quarto mandamento, Israel, no Antigo Testamento, já cumpria todas essas coisas. Os cristãos do Antigo Testamento descansavam sua fé no Messias vindouro e tinham a obrigação de dedicar-se a Jeová diariamente (Salmos 1.2). Assim, se a guarda do quarto mandamento significa meramente a dedicação e o descanso diário que os cristãos sempre observaram, mesmo sob o Antigo Pacto, o quarto mandamento se tornaria supérfluo e desnecessário. No entanto, tanto a Igreja do Antigo, quanto a do Novo Pacto, ainda que observassem um descanso e devoção diários, nunca desprezaram por isso a necessidade de guardar um dia em sete para o culto e repouso solene.
Objeção 3: Romanos 14.5-6 diz que o cristão maduro não faz distinção de dias, mas considera todos os dias iguais.
Resposta: A grande questão é se os dias dos quais o apóstolo trata aqui inclui o sábado moral, ou se ele se limita a tratar da observância cerimonial dos dias judaicos. Se for o último caso, este texto está em harmonia com outros no Novo Testamento que falam da abolição dos dias cerimoniais do judaísmo (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10). Mas se adotarmos a primeira interpretação, temos que admitir que o apóstolo Paulo está chamando de “fracos” aqueles que seguiam a prática comum da Igreja de dar uma consideração especial para o domingo (Atos 20.6-7; 1 Coríntios 16.2) e de considerá-lo o Dia do Senhor (Apocalipse 1.10). Como essa última interpretação é absurda, temos que concluir que a questão do quarto mandamento não é o ponto de discussão do apóstolo nesta passagem.
Objeção 4: Visto que o Novo Testamento não tem nenhum preceito explícito sobre a guarda domingo, o que permanece do quarto mandamento é a observância de um dia em sete. A Igreja, por convenção, adotou o primeiro dia da semana porque Cristo nele ressuscitou, mas poderia ter adotado qualquer outro dia se assim o quisesse.
Resposta: Com a nova administração da Aliança da Graça, alguns mandamentos, não obstante permanecessem essencialmente os mesmos, sofreram mudanças. Assim, por exemplo, embora o segundo mandamento estabelecesse o princípio regulador do culto a Deus, no Antigo Pacto ordenava-se que esse princípio fosse observado prestando a Jeová um culto que envolvia sacrifícios e rituais cerimoniais. O princípio de que o culto a Deus deveria ser regulado por Ele mesmo permaneceu inalterável, mas, na nova administração, a observância desse mesmo princípio não se dá pela prestação de um culto que siga estritamente os rituais da Lei cerimonial. A Igreja continuou observando o segundo mandamento, mas esse perdeu suas características cerimoniais e recebeu novas nuances com a nova administração. Observar o segundo mandamento segundo a antiga dispensação tornou-se até mesmo pecado.
Embora o Novo Testamento não tenha uma ordenança explícita sobre o Domingo, seu estabelecimento segue o mesmo raciocínio da passagem da circuncisão para o batismo e da páscoa para a ceia. Esses dois preceitos quando passam para o Novo Testamento, conservam uma continuidade histórica tão cristalina com sua forma anterior, que não há necessidade de um preceito que explicite isso. Não temos, por exemplo, um preceito explicitamente ordenando o batismo infantil, mas a continuidade histórica entre a circuncisão e o batismo é tão clara, que não houve necessidade de uma ordenança explícita para que o mandamento fosse recebido pela Igreja.
Desse modo, a mudança de dia foi natural. Até a ressurreição a Igreja observava o sétimo dia como seu dia de adoração e de descanso sagrado, depois da ressurreição, a Igreja passou a guardar o primeiro dia como seu dia de culto e repouso solene. O mesmo apreço que a Igreja tinha pelo sábado no Antigo Pacto passou a nutrir agora pelo Domingo na nova dispensação. A continuidade histórica era tão clara quanto aquela que estabeleceu o batismo como a circuncisão cristã e a ceia como a páscoa cristã. Desse modo, a Igreja outra coisa não fez senão receber o Domingo como o sábado cristão.
A escolha do dia não foi efetuada por mera convenção. Foi Deus quem estabeleceu, desde cedo, não só o princípio do repouso semanal, mas também em qual dia esse descanso havia de ser realizado. Lemos desde o princípio que Deus santificou o sétimo dia (Gênesis 2.2-3). Na nova administração permanece o mesmo princípio, cabe a Deus estabelecer o dia em que Ele quer ser especialmente cultuado. Foi Cristo quem ressuscitou no Domingo, foi Ele quem derramou o Espírito Santo sobre a Igreja em um Domingo e foi o mesmo Cristo quem descortinou sua revelação final à Igreja em um Domingo (Apocalipse 1.10). Logo, foi Cristo quem efetuou a mudança do sábado para o Domingo.
A própria Escritura estabelece o Domingo como o dia de guarda quando o chama de “o Dia do Senhor”. Que Apocalipse 1.10 se refere ao Domingo, e não ao Dia do Senhor escatológico, fica claro: (i) porque contexto está dando informações sobre onde (“na ilha de Patmos” v.9), como (“em espírito” v.10) e quando (“no dia do Senhor”) o apóstolo recebeu a revelação; (ii) porque a expressão usada no grego “κυριακῇ ἡμέρᾳ” é distinta daquela usada no Novo Testamento para o dia escatológico, a saber, “ἡμέρα Κυρίου/Ημέρα του Κυρίου”; (iii) porque a expressão “dia senhorial” foi usada como contraposição aos dias de culto ao Imperador, de modo que assim como os pagãos tinham um dia de culto ao Kyrios-Imperador, os cristãos tinham um dia de culto ao seu Senhor, isto é, o Domingo (Atos 20.6-7); (iv) porque o Apocalipse de João foi escrito no final do primeiro século quando a guarda do Domingo já estava mais estabelecida na Igreja e (v) porque a partir da metade do segundo século, pouco depois da escrita do Apocalipse, já encontramos testemunhos históricos de que a Igreja observava o Domingo como o dia do Senhor.
Assim, sendo que a Escritura diz que é Deus quem especifica o dia de guarda, que foi Cristo quem efetuou a mudança do sábado para o Domingo e visto que o Novo Testamento declara expressamente que o Domingo é o Dia do Senhor, somos proibidos de dizer que o dia específico de culto ao Senhor pode ser estabelecido por convenção. O Deus que pelo princípio regulador do culto estabelece como deve ser adorado, também é Aquele que tem a prerrogativa de instituir o dia de culto.
Objeção 5: A mudança do Sábado para o Domingo foi efetuada por Constantino no quarto século.
Resposta: Além dos argumentos precedentes que provam que o Domingo é o dia do Senhor conforme as Escrituras, podemos citar evidências históricas da patrística que provam que o primeiro dia da semana é reconhecido pela Igreja como o sábado cristão mesmo antes de Constantino¹:
Antes da ressurreição do nosso Senhor, Jesus observou o sábado no sétimo dia (Lucas 4.16), e assim também faziam os cristãos (Lucas 23.54-56). Então, Cristo ressuscitou no primeiro dia (Marcos 16.9), fez do domingo um dia de reunião com seus discípulos (Marcos 16.9-11; Mateus 28.8-10; Lucas 24.34; Marcos 16.12-13; João 20.19-23). No domingo, Cristo abençoou seus discípulos (João 20.19), soprou sobre eles o Espírito (João 20.22), ordenou-lhes a grande comissão (João 20.21), ascendeu aos céus (João 20.17) e em um domingo derramou o Seu Espírito sobre a Igreja no Pentecostes (Atos 2.1).
Com tantas demonstrações, a Igreja entendeu que Cristo havia mudado o dia de descanso do sábado para o domingo e, então, fez do Domingo o seu dia de culto (Atos 20.6-7; 1 Coríntios 16.2). No primeiro dia da semana, Cristo entregou sua última grande revelação à Igreja que já reconhecia o domingo como o Dia do Senhor (Apocalipse 1.10). A partir de então, o domingo passou a ser recebido pelos cristãos como o “sábado cristão”, ocupando um lugar especial na fé da Igreja desde a patrística até os símbolos reformados.
Assim, é estranho que um mandamento que tenha tido lugar desde a Criação, que tenha recebido o testemunho da Lei e dos Profetas, que foi restabelecido depois do exílio, observado por Cristo e os apóstolos e que continuou a ser observado pela Igreja ao longo da História, seja hoje tão atacado e negligenciado. Os argumentos contra o Domingo são de naturezas diversas, vem de dispensacionalistas que advogam a abolição da Lei, de sabatistas que negam a mudança do sábado para o domingo e de outros que pensam ter a Igreja adotado o primeiro dia da semana como dia de culto por mera convenção. Objetaremos contra alguns argumentos que têm sido levantados contra a obrigatoriedade da guarda do Domingo:
Objeção 1: A Lei foi abolida (Efésios 2.15). Cristo cumpriu a Lei em nosso lugar, desse modo, estamos desobrigados da observância do quarto mandamento.
Resposta: É verdade que o cristão não está debaixo da Lei como um Pacto de Obras, e nesse sentido, é correto dizer que a Lei foi abolida. Mas a observância da Lei ainda é obrigatória para o cristão como um meio do qual Deus faz uso para a santificação dos seus filhos. É nesse sentido que Cristo declara que a Lei não pode ser abolida (Mateus 5.17-18) e que o apóstolo Paulo afirma expressamente que a Lei não foi anulada (Romanos 3.31). É verdade que Cristo obedeceu a Lei Moral em nosso lugar como Pacto das Obras para nossa justificação e assim nós não temos que guardar a Lei para sermos justificados (Gálatas 2.16), mas isso não significa que não estejamos obrigados a obedecer a Lei divina para nossa santificação. Além disso, a Lei da qual fala Efésios 2.15 é a Lei na forma de ordenanças e mandamentos que separava judeus e gentios, isto é, a Lei cerimonial. A Lei cerimonial do Antigo Testamento foi revogada com a morte de Cristo, mas a Lei moral permanece irrevogável.
Objeção 2: O quarto mandamento é de natureza cerimonial (Levítico 23.3) e foi abolido como as demais cerimonias do judaísmo (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10).
Resposta: Embora o Antigo Testamento fale de sábados cerimoniais, que até mesmo poderiam cair em um dia que não fosse o sétimo (Levítico 23.3,11,15,16,32,38) e, ainda que o Novo Testamento ensine que esses sábados cerimoniais tenham sido abolidos juntamente com os demais dias de festividades judaicas (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10), esse sábado cerimonial deve ser distinguido do sábado moral. Enquanto os sábados cerimoniais são apresentados nas Escrituras ao lado das festividades judaicas (Oséias 2.11), o sábado moral é apresentado no contexto dos mandamentos morais. Ele é incluído como um mandamento criacional e um dos princípios morais do Decálogo.
Que todos os mandamentos do Decálogo são de natureza moral, isso fica claro: (i) pela própria natureza dos mandamentos que estão gravados na consciência de todos os homens e que se manifestam em todas as culturas; (ii) porque os profetas sempre que denunciam os pecados do povo fazem isso expondo algum mandamento do Decálogo; (iii) porque Cristo resumiu a Lei Moral tendo em mente as duas tábuas do Decálogo: amar a Deus (primeiro ao quarto mandamentos) e amar ao próximo (quinto ao décimo mandamento) – Mateus 22.35-40; (iv) porque os apóstolos receberam os dois grandes mandamentos de Cristo sobre o amor como um resumo dos mandamentos do Decálogo (Romanos 13.9); (v) porque Cristo apresentou o Decálogo ao jovem rico como o código perfeito de Deus que se integralmente obedecido garantiria a posse da vida eterna (Marcos 10.17-19); (vi) porque a Igreja, iluminada pelo Espírito, em suas mais variadas vertentes, sempre recebeu o Decálogo como a exposição fiel da Lei moral de Deus, dando a ele um lugar especial em seus símbolos de fé.
Visto que o Decálogo é um resumo da Lei Moral de Deus, o quarto mandamento que ordena a guarda do sábado não pode ser um preceito cerimonial distinto dos outros nove. Além disso, o sábado foi instituído antes da Queda (Gênesis 2.1-4), antes, portanto, que se pudesse estabelecer qualquer preceito cerimonial. Sendo anterior à Queda, o sábado não pode ser da mesma natureza daqueles princípios cerimoniais que fazem parte dos rituais de expiação do Antigo Pacto. Assim, visto que o quarto mandamento é moral, sua obediência permanece obrigatória a todos os homens tanto quanto os demais mandamentos do Decálogo.
Há quem admita que o quarto mandamento seja um preceito moral e que sua observância continue em nossos dias, mas afirmam que ele não mais se refere à observância de um dia. Ensinam que cumprimos o quarto mandamento, hoje, simplesmente por descansarmos nossa salvação em Cristo ou por separarmos todos os dias um momento de descanso e dedicação a Deus. Mas se isso é assim, não haveria necessidade do quarto mandamento. Se não houvesse o quarto mandamento, a Igreja continuaria descansando sua salvação em Cristo e ainda estaria obrigada pela Lei a cultuar a Deus e repousar diariamente. Além disso, mesmo com o quarto mandamento, Israel, no Antigo Testamento, já cumpria todas essas coisas. Os cristãos do Antigo Testamento descansavam sua fé no Messias vindouro e tinham a obrigação de dedicar-se a Jeová diariamente (Salmos 1.2). Assim, se a guarda do quarto mandamento significa meramente a dedicação e o descanso diário que os cristãos sempre observaram, mesmo sob o Antigo Pacto, o quarto mandamento se tornaria supérfluo e desnecessário. No entanto, tanto a Igreja do Antigo, quanto a do Novo Pacto, ainda que observassem um descanso e devoção diários, nunca desprezaram por isso a necessidade de guardar um dia em sete para o culto e repouso solene.
Objeção 3: Romanos 14.5-6 diz que o cristão maduro não faz distinção de dias, mas considera todos os dias iguais.
Resposta: A grande questão é se os dias dos quais o apóstolo trata aqui inclui o sábado moral, ou se ele se limita a tratar da observância cerimonial dos dias judaicos. Se for o último caso, este texto está em harmonia com outros no Novo Testamento que falam da abolição dos dias cerimoniais do judaísmo (Colossenses 2.16-17; Gálatas 4.10). Mas se adotarmos a primeira interpretação, temos que admitir que o apóstolo Paulo está chamando de “fracos” aqueles que seguiam a prática comum da Igreja de dar uma consideração especial para o domingo (Atos 20.6-7; 1 Coríntios 16.2) e de considerá-lo o Dia do Senhor (Apocalipse 1.10). Como essa última interpretação é absurda, temos que concluir que a questão do quarto mandamento não é o ponto de discussão do apóstolo nesta passagem.
Objeção 4: Visto que o Novo Testamento não tem nenhum preceito explícito sobre a guarda domingo, o que permanece do quarto mandamento é a observância de um dia em sete. A Igreja, por convenção, adotou o primeiro dia da semana porque Cristo nele ressuscitou, mas poderia ter adotado qualquer outro dia se assim o quisesse.
Resposta: Com a nova administração da Aliança da Graça, alguns mandamentos, não obstante permanecessem essencialmente os mesmos, sofreram mudanças. Assim, por exemplo, embora o segundo mandamento estabelecesse o princípio regulador do culto a Deus, no Antigo Pacto ordenava-se que esse princípio fosse observado prestando a Jeová um culto que envolvia sacrifícios e rituais cerimoniais. O princípio de que o culto a Deus deveria ser regulado por Ele mesmo permaneceu inalterável, mas, na nova administração, a observância desse mesmo princípio não se dá pela prestação de um culto que siga estritamente os rituais da Lei cerimonial. A Igreja continuou observando o segundo mandamento, mas esse perdeu suas características cerimoniais e recebeu novas nuances com a nova administração. Observar o segundo mandamento segundo a antiga dispensação tornou-se até mesmo pecado.
Embora o Novo Testamento não tenha uma ordenança explícita sobre o Domingo, seu estabelecimento segue o mesmo raciocínio da passagem da circuncisão para o batismo e da páscoa para a ceia. Esses dois preceitos quando passam para o Novo Testamento, conservam uma continuidade histórica tão cristalina com sua forma anterior, que não há necessidade de um preceito que explicite isso. Não temos, por exemplo, um preceito explicitamente ordenando o batismo infantil, mas a continuidade histórica entre a circuncisão e o batismo é tão clara, que não houve necessidade de uma ordenança explícita para que o mandamento fosse recebido pela Igreja.
Desse modo, a mudança de dia foi natural. Até a ressurreição a Igreja observava o sétimo dia como seu dia de adoração e de descanso sagrado, depois da ressurreição, a Igreja passou a guardar o primeiro dia como seu dia de culto e repouso solene. O mesmo apreço que a Igreja tinha pelo sábado no Antigo Pacto passou a nutrir agora pelo Domingo na nova dispensação. A continuidade histórica era tão clara quanto aquela que estabeleceu o batismo como a circuncisão cristã e a ceia como a páscoa cristã. Desse modo, a Igreja outra coisa não fez senão receber o Domingo como o sábado cristão.
A escolha do dia não foi efetuada por mera convenção. Foi Deus quem estabeleceu, desde cedo, não só o princípio do repouso semanal, mas também em qual dia esse descanso havia de ser realizado. Lemos desde o princípio que Deus santificou o sétimo dia (Gênesis 2.2-3). Na nova administração permanece o mesmo princípio, cabe a Deus estabelecer o dia em que Ele quer ser especialmente cultuado. Foi Cristo quem ressuscitou no Domingo, foi Ele quem derramou o Espírito Santo sobre a Igreja em um Domingo e foi o mesmo Cristo quem descortinou sua revelação final à Igreja em um Domingo (Apocalipse 1.10). Logo, foi Cristo quem efetuou a mudança do sábado para o Domingo.
A própria Escritura estabelece o Domingo como o dia de guarda quando o chama de “o Dia do Senhor”. Que Apocalipse 1.10 se refere ao Domingo, e não ao Dia do Senhor escatológico, fica claro: (i) porque contexto está dando informações sobre onde (“na ilha de Patmos” v.9), como (“em espírito” v.10) e quando (“no dia do Senhor”) o apóstolo recebeu a revelação; (ii) porque a expressão usada no grego “κυριακῇ ἡμέρᾳ” é distinta daquela usada no Novo Testamento para o dia escatológico, a saber, “ἡμέρα Κυρίου/Ημέρα του Κυρίου”; (iii) porque a expressão “dia senhorial” foi usada como contraposição aos dias de culto ao Imperador, de modo que assim como os pagãos tinham um dia de culto ao Kyrios-Imperador, os cristãos tinham um dia de culto ao seu Senhor, isto é, o Domingo (Atos 20.6-7); (iv) porque o Apocalipse de João foi escrito no final do primeiro século quando a guarda do Domingo já estava mais estabelecida na Igreja e (v) porque a partir da metade do segundo século, pouco depois da escrita do Apocalipse, já encontramos testemunhos históricos de que a Igreja observava o Domingo como o dia do Senhor.
Assim, sendo que a Escritura diz que é Deus quem especifica o dia de guarda, que foi Cristo quem efetuou a mudança do sábado para o Domingo e visto que o Novo Testamento declara expressamente que o Domingo é o Dia do Senhor, somos proibidos de dizer que o dia específico de culto ao Senhor pode ser estabelecido por convenção. O Deus que pelo princípio regulador do culto estabelece como deve ser adorado, também é Aquele que tem a prerrogativa de instituir o dia de culto.
Objeção 5: A mudança do Sábado para o Domingo foi efetuada por Constantino no quarto século.
Resposta: Além dos argumentos precedentes que provam que o Domingo é o dia do Senhor conforme as Escrituras, podemos citar evidências históricas da patrística que provam que o primeiro dia da semana é reconhecido pela Igreja como o sábado cristão mesmo antes de Constantino¹:
A Epístola de Barnabé (cerca de 100 dC) - “Portanto,
também nós mantemos o oitavo dia com alegria, o dia também em que Jesus
ressuscitou dos mortos”.
A Epístola de Inácio (cerca de 107 dC) - “Não
vos enganeis com estranhas doutrinas, nem com as fábulas antigas, que não são
proveitosas. Porque, se nós ainda vivemos segundo a Lei Judaica, nós
reconhecemos que não temos recebido Graça... Portanto, aqueles que foram
educados na antiga ordem das coisas vieram à posse de uma nova esperança, não
mais observando o sábado, mas vivendo na observância da Dia do Senhor, em que
também a nossa vida surgiu novamente por Ele e por Sua morte”.
Justino Mártir (cerca de 140 dC) - “E no dia
chamado domingo todos os que vivem nas cidades ou no campo se reúnem em um só
lugar, e as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas são lidos. ...
Mas o Domingo é o dia em que todos têm uma assembleia em comum, porque é
primeiro dia da semana em que Deus ... fez o mundo; e Jesus Cristo, nosso
Salvador no mesmo dia ressuscitou dos mortos ".
Bardesanes, Edessa (180 dC) - “No primeiro da
semana, nós nos reunimos juntos, em assembleia”.
Clemente de Alexandria (194 dC) - “Ele, em
cumprimento do preceito, segundo o evangelho, mantém o Dia do Senhor ...
glorificando ao Senhor pela Sua ressurreição”.
Tertuliano (200 dC) - “Nós tornamos
solene o dia depois do sábado, em contradição com aqueles que chamam este dia o
seu sábado”.
Irineu (cerca 155-202 dC) - “O mistério da
ressurreição do Senhor não pode ser comemorado em qualquer dia senão no Dia do
Senhor, e somente nele devemos observar o descanso da festa de Páscoa”.
Cipriano (250 dC) - “O oitavo dia, isto é, o
primeiro dia após o sábado, é o Dia do Senhor ”.
Anatólio (AD 270) - “Nossa preocupação com a
ressurreição do Senhor, que teve lugar no Dia do Senhor nos levará a
celebrá-lo”.
Pedro, Bispo de Alexandria (306 dC) - “Mas
o Dia do Senhor, nós celebramos como um dia de alegria, porque nele, Ele [o
Senhor] ressuscitou”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Aqueles que desprezam a guarda do quarto mandamento, não observando o primeiro dia da semana, estão transgredindo os santos mandamentos de Deus. Devemos defender o Domingo como o dia no qual a Igreja observa o quarto mandamento, mas não só isso, devemos observá-lo como dia de culto e descanso solene. Benditos sejam aqueles que observam o sábado cristão e não profanam o santo dia do Senhor: “Bem-aventurado o homem que fizer isto, e o filho do homem que lançar mão disto: que se abstém de profanar o sábado, e guarda a sua mão de cometer o mal.” - Isaías 56.2.
Notas:
[1] O Sábado foi primeiramente dado a Israel, e é o Sinal de Deus para Israel – David Cloud. Disponível em: http://solascriptura-tt.org/Seitas/SabadoPrimeiramenteDadoAIsrael.EhSinalDeusPIsrael-DCloud.htm
Autor: Bruno dos Santos Queiroz
Divulgação: Bereianos
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