Creio
em milagres. Creio que Deus cura hoje em resposta às orações de seu povo.
Durante meu ministério pastoral, tenho orado por pessoas doentes que ficaram
boas. Contudo, apesar de todas as orações, pedidos e súplicas que os crentes
fazem a Deus quando ficam doentes, é um fato inegável que muitos continuam
doentes e eventualmente, chegam a morrer.
Apesar
do ensino popular de que a fé nos cura de todas as enfermidades, uma breve
consulta feita à capelania hospitalar de grandes hospitais do nosso país revela
que há um número elevado de evangélicos hospitalizados — tradicionais,
pentecostais e neopentecostais — sofrendo dos mais diversos tipos de males. A
proporção de evangélicos nos hospitais acompanha a proporção de evangélicos no
país. As doenças não fazem distinção religiosa.
Para muitos evangélicos, no entanto, os
crentes adoecem e não são curados porque lhes falta fé em Deus.
Será que poderemos dizer que todos eles
— sem exceção — estão ali porque pecaram contra Deus, ficaram vulneráveis aos
demônios e não têm fé suficiente para conseguir a cura?
É
nesse ponto que muitos evangélicos que adoeceram, ou que têm parentes e amigos
evangélicos que adoeceram, entram numa crise de fé. Muitos, decepcionados com a
sua falta de melhora, ou com a morte de outros crentes fiéis, passam a não crer
mais em nada e abandonam suas igrejas e o próprio Evangelho. Outros permanecem,
mas marcados pela dúvida e incerteza. Todavia, conforme a Bíblia e a história
nos ensinam, mesmo homens de fé podem ficar doentes.
Há
diversos exemplos na Bíblia de homens de fé que ficaram doentes e até morreram
dessas enfermidades. Um deles foi o profeta Eliseu, que padeceu de uma
enfermidade que o levou a morte: “E Eliseu estava doente da enfermidade de que
morreu…” (2 Reis 13.14) Outro, foi Timóteo. Paulo recomendou-lhe um remédio
caseiro por causa de problemas estomacais e enfermidades frequentes: “Não bebas
mais água só, mas usa de um pouco de vinho, por causa do teu estômago e das
tuas frequentes enfermidades.” (1 Timóteo 5.23) Ao final do seu ministério,
Paulo registra a doença de um amigo que ele mesmo não conseguiu curar: “Erasto
ficou em Corinto, e deixei Trófimo doente em Mileto.” (2 Timóteo 4.20 ACF).
O
próprio Paulo padecia do que chamou de “espinho na carne”. Apesar de suas
orações e súplicas, Deus não o atendeu, e o apóstolo continuou a padecer desse
mal (2 Coríntios 12.7-9). Alguns acham que se tratava da mesma enfermidade da
qual Paulo padeceu quanto esteve entre os Gálatas: “E não rejeitastes, nem
desprezastes isso que era uma tentação na minha carne …” (Gálatas 4.14). Outros
acham que era uma doença nos olhos, pois logo em seguida Paulo diz: “… Porque
vos dou testemunho de que, se possível fora, arrancaríeis os vossos olhos, e
mos daríeis.” (Gálatas 4.15). Também podemos mencionar Epafrodito, que ficou
gravemente doente quando visitou o apóstolo Paulo:
“…
[Epafrodito] esteve doente, e quase à morte; mas Deus se apiedou dele, e não
somente dele, mas também de mim, para que eu não tivesse tristeza sobre
tristeza.” (Filipenses 2.26-27).
Temos
ainda o caso de Jó, que mesmo sendo justo, fiel e temente a Deus, foi afligido
durante vários meses por uma enfermidade, que a Bíblia descreve como sendo
infligida por Satanás com permissão de Deus: “7 Então saiu Satanás da presença
do SENHOR, e feriu a Jó de úlceras malignas, desde a planta do pé até ao alto
da cabeça. 8 E Jó tomou um caco para se raspar com ele; e estava assentado no
meio da cinza.” (Jó 2.7-8). Isaque, o grande servo de Deus, sofria da vista
quando envelheceu, a ponto de não saber distinguir entre Jacó e Esaú: “…como
Isaque envelheceu, e os seus olhos se escureceram, de maneira que não podia ver
….” (Gênesis 27.1 ACF). Esses e outros exemplos mostram que homens de Deus,
fiéis e santos, foram vitimados por doenças e enfermidades.
O
mesmo ocorre na história da Igreja. Nem mesmo cristãos de destaque escaparam
das doenças e dos males. João Calvino era um homem com várias enfermidades.
Mesmo aqueles que passaram a vida toda defendendo a cura pela fé sofreram com
as doenças, e alguns acabaram morrendo. Um deles foi Edward Irving, o pai do
movimento carismático. Pregador brilhante, Irving acreditava que Deus estava
restaurando na terra os dons apostólicos, inclusive o da cura divina. Ainda
jovem, contraiu uma doença fatal. Morreu doente, sozinho, frustrado e
decepcionado com Deus.
Outro
caso conhecido é o de Adoniran Gordon, um dos principais líderes do movimento
de cura pela fé no século 20. Gordon morreu de bronquite, apesar da sua fé e da
fé de seus amigos. A. B. Simpson, outro líder do movimento da cura pela fé,
morreu de paralisia e arteriosclerose. Recentemente, morreu John Wimber,
vitimado por um câncer de garganta. Wimber foi o fundador da igreja Vineyard
Fellowship (Comunhão da Vinha ou Videira) e do movimento moderno de “sinais e
prodígios”. Ele, à semelhança de Gordon e Simpson, acreditava que, pela fé em
Cristo, o crente jamais ficaria doente.
Líderes
do movimento de cura pela fé no Brasil também têm ficado doentes. Não poucos
usam óculos para corrigir defeitos na vista e até têm problemas nas mãos.
Cristãos
verdadeiros, pessoas de fé, eventualmente adoeceram e morreram de enfermidades,
conforme a Bíblia e a história claramente demonstram. Isso significa que as
doenças nem sempre representam falta de fé e que Deus se reserva o direito
soberano de curar quem ele quiser.
Publicado originalmente no blog O
Tempora, O Mores!
- Augustus Nicodemus é pastor
presbiteriano.
Fonte: www.cristaoreformado.com.br
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