A prática do batismo infantil foi adotada muito cedo pela igreja cristã. De fato, já no século 2 há evidências de que os cristãos batizavam seus bebês, uma vez que criam no batismo como uma forma de remissão de pecados e capaz de garantir a salvação das vítimas de morte prematura.
É verdade que Tertuliano de Cartago († c. 220) se insurgiu contra essa
prática. Porém, ele o fez porque entendia que o arrependimento para
perdão de pecados mortais só poderia ocorrer uma vez depois do batismo.
Segundo Tertuliano, esse fato deixava os que eram batizados muito cedo
em situação perigosa, sujeitos a perder, irremediavelmente e para
sempre, o favor de Deus na fase adulta. Para ele, esse era o motivo pelo
qual o batismo devia ser protelado até que a pessoa se sentisse mais
distante do perigo de cometer pecados mortais como o adultério, o
assassinato ou a apostasia.
Se, por um lado, há ampla
evidência histórica para o pedobatismo, de outro, não há nenhum
fundamento bíblico para essa prática. A despeito disso, os defensores do
batismo infantil apresentam alguns argumentos em sua defesa.
O primeiro desses argumentos (e talvez o mais popular) é construído a partir da história narrada em Atos 16.27-34, referente à conversão do carcereiro de Filipos e seus familiares. Segundo o texto, depois que ouviram a Palavra do Senhor, o carcereiro foi batizado, ele e todos os da sua casa (At 16.33).
No entender dos pedobatistas, certamente havia crianças bem pequenas
naquela família, sendo todas incluídas no batismo realizado naquela
ocasião. É difícil, porém, levar esse argumento a sério, posto que se
sustenta unicamente sobre o frágil alicerce da imaginação e da
criatividade dos seus proponentes. Para desmantelá-lo, basta lembrar o
fato óbvio de que nem todas as famílias têm bebês em casa.
A
defesa do batismo infantil tem, na verdade, colunas de apoio muito mais
sólidas do que o argumento exposto acima. Seus proponentes mais capazes
expõem razões que merecem consideração séria e análise mais bem
elaborada.
É o caso do argumento relativo ao Pacto. Os
pedobatistas entendem que, assim como os bebês dos israelitas eram
circuncidados pelo fato de seus pais pertencerem ao Pacto entre Deus e a
nação judaica (Gn 17.10-14), da mesma forma os bebês dos
crentes devem ser batizados, uma vez que seus pais, desde o dia em que
se converteram, tornaram-se participantes do mesmo Pacto por meio da fé
em Cristo (Gl 3.7,29). Essa concepção ainda admite
expressamente que os filhos de quem participa do Pacto também pertencem
ao Pacto, estando aí a razão principal para que se sujeitem ao símbolo
do Pacto. Ora, no passado, o símbolo do Pacto foi a circuncisão, mas,
como ela foi anulada (Gl 5.2,6; 6.15), o batismo a substituiu.
Assim, de acordo com essa visão, o batismo infantil é o correspondente
cristão da circuncisão judaica.
Essa conexão entre circuncisão e batismo é defendida especialmente com base em Colossenses 2.11-12.
Nesse texto, dizem, circuncisão e batismo estão ligados, ambos
representando o fim da velha vida de pecado, havendo, assim, forte
associação entre os dois ritos. Em seu desdobramento final, toda essa
argumentação afirma o seguinte: se Paulo iguala a circuncisão e ao
batismo e se o primeiro era aplicado aos bebês, nenhum absurdo há em
aplicar também o batismo aos recém-nascidos.
Outro intrigante argumento em prol do batismo infantil é baseado em Romanos 4.11. Esse argumento é construído assim: Em Romanos 4.11, Paulo define a circuncisão como “selo da justiça da fé”. Ora, no Velho Testamento, Deus ordenou que esse “selo da justiça da fé” fosse aplicado a bebês que não tinham fé (Lv 12.3).
Logo, não é errado gravar com um selo de fé as crianças que ainda não
creem. Condenar essa prática seria reprovar o que o próprio Deus
ordenou! Assim, considerando que o batismo também é um selo de fé, nada
há de errado em aplicá-lo ao bebê que ainda não crê. Se o próprio Deus
mandou que isso fosse feito, quem somos nós para dizer que é preciso
crer antes de receber o selo da fé?
Se tudo isso é correto, por que os batistas e outros evangélicos não batizam bebês? As razões disso serão expostas em seguida.
Os argumentos que defendem o batismo infantil, ainda que muito bem elaborados, estão sujeitos a sérios questionamentos. Primeiro: a noção de que a participação dos pais crentes no Novo Pacto autoriza o batismo de seus filhos, da mesma forma que a participação dos pais israelitas no Velho Pacto impunha-lhes o dever de circuncidar seus bebês merece grave objeção. Isso porque o bebê israelita não era circuncidado porque seus pais eram israelitas. Ele era circuncidado porque, sendo filho de judeus, ele próprio era israelita. A causa direta da circuncisão do bebê judeu não estava nos pais, mas no próprio bebê, no fato de ele mesmo ser um judeu. Ora, não é esse o caso dos filhos dos crentes. Estes não nascem crentes, inexistindo neles próprios qualquer razão para que recebam o batismo. De fato, se o filho do israelita nascia israelita e, por isso, era circuncidado, o filho do cristão, por sua vez, não nasce cristão, não havendo razão nenhuma para ser batizado.
Há também grave deficiência no ensino, exposto na primeira parte deste
artigo, de que o batismo é um substituto da circuncisão. Na verdade,
absolutamente nada na Bíblia corrobora essa concepção. Mesmo o texto de Colossenses 2.11,12
está mui longe de confirmá-la. Aliás, uma simples leitura dessa
passagem deixará o leitor surpreso, questionando onde é possível
encontrar ali qualquer base para o ensino de que o batismo ocupa hoje o
lugar do rito judaico.
A eventual surpresa do leitor será fácil de ser compreendida. Isso porque Colossenses 2.11,12
fala claramente da circuncisão do coração e do batismo do crente na
morte de Cristo, ou seja, trata de realidades espirituais e não de ritos
externos. Ademais, a passagem aponta essas realidades espirituais como
fenômenos distintos e não como se o segundo fosse substituto do
primeiro.
Com efeito, em Colossenses 2.11,12, Paulo explica que o crente foi circuncidado por Cristo (Rm 2.28,29). Isso significa, conforme o próprio v.11 esclarece, que sua natureza pecaminosa foi despojada e enfraquecida (Rm 6.6). Em seguida, o apóstolo afirma que esse milagre aconteceu quando o crente foi batizado na morte do Senhor (v.12), isto é, quando, pela fé, ele se uniu ao Salvador, morrendo para o pecado e ressuscitando para uma vida nova (Rm 6.3,4).
Assim, Paulo trata nessa passagem de duas realidades ligadas, porém
ligeiramente distintas: a participação do crente na morte de Cristo (o
que é chamado de batismo) e o amortecimento de sua natureza pecaminosa
(a circuncisão do coração) decorrente da participação na morte do
Senhor. Esse e somente esse é o ensino claro da passagem, estando mui
longe de servir de base para a noção de que o batismo é a versão cristã
da circuncisão judaica. Consequentemente, batizar bebês sob tal pretexto
é prática carente de fundamento sólido.
Quanto ao argumento construído sobre Romanos 4.11,
onde a circuncisão é chamada de “selo da justiça da fé”, este também é
facilmente desfeito. Conforme visto, seus proponentes afirmam que a
circuncisão, um selo da justiça da fé, devia ser aplicado a bebês sem
fé, de modo que, segundo eles, nada pode haver de errado em fazer o
mesmo com o batismo, outro selo da justiça da fé. Essa linha de
raciocínio, contudo, está equivocada, pois, ao chamar a circuncisão de
selo da justiça da fé, Paulo se refere à circuncisão específica de
Abraão. Tanto isso é verdade que, se o texto em análise for lido com
atenção, fatalmente saltará aos olhos que a circuncisão ali mencionada é
vista como um selo da justiça procedente da fé que Abraão teve quando ainda incircunciso.
A circuncisão isoladamente considerada, portanto, não era um selo de
fé, mas apenas uma marca distintiva no corpo dos que participavam da
Antiga Aliança. Para receber um selo de fé, é preciso ter fé. Foi por
isso que quando o eunuco etíope perguntou a Filipe se podia ser
batizado, o evangelista respondeu: “É lícito, se crês de todo o coração”
(At 8.37).
Desse modo, batizar bebês permanece uma
prática sem qualquer base nas Escrituras. Na verdade, apenas crianças
que já compreenderam o evangelho e aceitaram sua mensagem podem ser
batizadas. Com efeito, a Bíblia diz que antes de ser batizada a pessoa
deve arrepender-se e crer em Cristo (At 2.38,41,42; 8.37). E mais: as Escrituras mostram que o batismo é um símbolo de nossa morte para o pecado e ressurreição para uma nova vida (Rm 6.4,11). Por isso, somente podem participar do símbolo os que já participaram da realidade que ele representa.
Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria
Fonte: http://www.igrejaredencao.org.br
Imagem: Google
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