Sei que esse assunto já foi batido e rebatido
várias vezes, por isso é possível que esse texto não apresente nenhuma novidade
para alguns irmãos. Entretanto, gostaria de compilar aqui algumas das melhores
razões para não usarmos a expressão levita para designar as pessoas que
tocam e cantam no “período de louvor”. E mesmo que você não use o termo,
proponho que leia pelo prazer de ver a história da salvação se desenrolando na
figura do sacerdote.
Com isso, desejo não apenas levar irmãos a repensarem esse costume, mas também mostrar que a teologia por trás do sacerdócio levítico é muito mais bela, ampla e grandiosa do que parece. Quero deixar claro (antes que alguém objete) que uma igreja pode usar essa expressão e ainda realizar cultos de adoração verdadeira, e que ninguém será condenado pelo uso do termo. Entretanto, não há nenhuma boa razão para cometer esse erro deliberadamente. E, creio, qualquer desvio do ensino bíblico, mesmo os que parecem mais simples, podem ser portas para distorções perigosas. Por isso, sugiro que líderes e pastores levem em consideração o que está exposto aqui.
Com isso, desejo não apenas levar irmãos a repensarem esse costume, mas também mostrar que a teologia por trás do sacerdócio levítico é muito mais bela, ampla e grandiosa do que parece. Quero deixar claro (antes que alguém objete) que uma igreja pode usar essa expressão e ainda realizar cultos de adoração verdadeira, e que ninguém será condenado pelo uso do termo. Entretanto, não há nenhuma boa razão para cometer esse erro deliberadamente. E, creio, qualquer desvio do ensino bíblico, mesmo os que parecem mais simples, podem ser portas para distorções perigosas. Por isso, sugiro que líderes e pastores levem em consideração o que está exposto aqui.
1) Nem todos os levitas eram músicos
A Bíblia relata, é verdade, que existiam levitas
envolvidos com a música no antigo Israel. Vemos corais e bandas formados por
membros da tribo de Levi e voltados exclusivamente para esse ministério.
Entretanto, também lemos sobre levitas que cuidavam de outras atividades
cultuais, como o sacrifício, e aqueles que se envolviam em tarefas
administrativas e operacionais.
Sei que alguns defensores da expressão “levita” sabem disso. (Por exemplo, o polêmico concurso “Promessas” admite isso em seu site oficial). Ainda assim, preferiu-se ignorar todas as outras funções associadas ao ministério levítico e concentrar-se apenas nessa. Por quê?
Sei que alguns defensores da expressão “levita” sabem disso. (Por exemplo, o polêmico concurso “Promessas” admite isso em seu site oficial). Ainda assim, preferiu-se ignorar todas as outras funções associadas ao ministério levítico e concentrar-se apenas nessa. Por quê?
Alguns entendem que é por estrelismo dos músicos,
mas prefiro pensar que há um motivo mais profundo – a valorização medieval de
funções “sagradas” em detrimento de funções “seculares”. Varrer o chão,
organizar culto, carregar coisas – qualquer um faz. Adorar, somente os crentes.
Há um fundo de verdade aí, mas também há uma ignorância quanto ao chamado geral
de Deus para humanidade. Tanto o administrador quanto o zelador podem
glorificar a Deus em suas respectivas funções. Isso não é um culto público, mas
é um culto.
Assim, alguém responsável por assuntos cotidianos
como arrumar cortinas do templo poderia “ser tão adorador” quanto Asafe, o
compositor. E um músico no culto público pode estar profanando o nome de Deus –
se seu alvo não for a glória do Criador.
2) O chamado levítico originalmente envolvia toda a
humanidade
Um dos assuntos mais interessantes da Bíblia é a teologia do local de adoração. Quando Adão e Eva foram criados, eles receberam um chamado de glorificar a Deus por meio do casamento e da procriação, do domínio sobre a natureza e do descanso no sétimo dia. E eles foram colocados em um Jardim, onde poderiam adorar o Criador e exercer a função de guardar e cuidar do Éden.
Um dos assuntos mais interessantes da Bíblia é a teologia do local de adoração. Quando Adão e Eva foram criados, eles receberam um chamado de glorificar a Deus por meio do casamento e da procriação, do domínio sobre a natureza e do descanso no sétimo dia. E eles foram colocados em um Jardim, onde poderiam adorar o Criador e exercer a função de guardar e cuidar do Éden.
Algo que passa despercebido pela maioria dos
cristãos é que Moisés e outros autores bíblicos repetiram certas expressões e
símbolos sobre o Jardim do Éden quando falavam sobre o tabernáculo e o
templo. Ou seja, o Éden era um “templo” que deveria ser guardado pelos
primeiros levitas – Adão e Eva. O termo “lavrar e guardar” (Gn
2.15) é o mesmo usado para as funções dos levitas em Números 3.7-8, 8.26
e 18.5-6. O chamado de adoração e cuidado com o “templo” é um
chamado geral, dado a nossos primeiros pais, assim como o casamento, a família,
o trabalho e o descanso.
“Se o Éden é visto como um santuário ideal, então
talvez Adão deva ser descrito como um Levita arquetípico” (Gordon J.
Wenham)¹
3) O levita tinha um papel de mediador, assumido por Cristo
Como ungidos do Senhor, os levitas tinham um papel de mediar a Aliança entre Yahweh e o povo de Israel. Eles não eram simplesmente pessoas que “ministravam a adoração” para a congregação. Muitos veem o povo realizando sacrifícios e entendem que aquilo era o paralelo de nossos momentos de louvor hoje. Há certa relação, mas os sacerdotes faziam muito mais.
Como mediadores, eles exerciam o papel de representar Deus para o povo e representar o povo para Deus. É por isso que esse era um cargo de extrema importância e perigo. Se o levita chegasse contaminado na presença de Deus, ele estava dizendo que a nação estava em pecado. Se ele chegasse maculado na presença de Israel, era uma blasfêmia – “Deus” estava corrompido. Eles não estavam simplesmente realizando cultos, eles tornavam o culto possível.
Hoje, esse papel é cumprido perfeitamente por nosso sacerdote e cordeiro Jesus. Como perfeito Deus e perfeito homem, ele pode posicionar-se como representante de Yahweh diante do povo e representante da igreja diante de Deus. Como afirma o Apóstolo, “há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem” (1 Tm 2.5). Assim, o ministro de louvor hoje é meramente alguém dependente do verdadeiro mediador, aquele que torna o culto possível, o Senhor Jesus.
4) Jesus não é representante do sacerdócio levítico
Entretanto, apesar de sacerdote, Jesus não pode ser considerado um levita. Um motivo para isso é biológico – ele não é descendente de Levi, mas de Judá. Como ele poderia assumir a função sacerdotal? O segundo motivo é teológico. O autor de Hebreus ensina que Jesus é sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque (Hb 5.10).
Entretanto, apesar de sacerdote, Jesus não pode ser considerado um levita. Um motivo para isso é biológico – ele não é descendente de Levi, mas de Judá. Como ele poderia assumir a função sacerdotal? O segundo motivo é teológico. O autor de Hebreus ensina que Jesus é sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque (Hb 5.10).
O Salmo 110 (não sem motivo o texto do Antigo
Testamento mais citado no Novo) nos fala de um rei-sacerdote que se assenta no
trono de Davi. De fato, o próprio Davi cumpriu certas funções sacerdotais sem
ser realmente um levita. Como isso seria possível? Isso acontece porque esse
sacerdote é da mesma ordem de um misterioso personagem de Gênesis 14, um rei de
Salém (note as sílabas finais de uma tal Jerusalém) chamado Melquisedeque.
Esse personagem, por estar envolto em tanto
mistério, é considerado uma figura de Cristo. Ele era “sem pai, sem mãe, sem
genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de vida, mas sendo feito
semelhante ao Filho de Deus” (Hb 7.3) e tanto rei de justiça, quanto
de paz (7.2). Assim, valorizar demais o sacerdócio levítico pode nos levar a
renegar uma ordem superior, a de Melquisedeque, por quem vem a perfeição (Hb
7.11).
5) A Nova Aliança, da qual fazemos parte, tornou o sacerdócio levítico caduco
5) A Nova Aliança, da qual fazemos parte, tornou o sacerdócio levítico caduco
O autor de Hebreus vai mais além e diz que o
sacerdócio da ordem de Arão foi revogado. Diante da superioridade de um
sacerdote que é eterno (Hb 7.24), mediador de uma Aliança superior (Hb
8.6), ele conclui que o sistema anterior era fraco e não podia aperfeiçoar
(7.18,19).
Usando o relato sobre Abraão e Melquisedeque, o
autor de Hebreus mostra que, quando o Patriarca entregou seus dízimos ao Rei de
Salém, estava ali comprovado que o sacerdócio levítico era inferior ao
sacerdócio de Jesus. Como assim? Ele explica que a tribo de Levi era
responsável pelo recolhimento do dízimo no antigo Israel. Mas o que vemos em
Gênesis? Um antepassado dos levitas entregando as ofertas e sendo abençoado por
outro sacerdote! Levi, ainda nos lombos de Abraão (7.10), colocou-se debaixo da
autoridade de Melquisedeque. Como sabemos, somente o maior abençoa o menor
(7.7).
Assim, depois dessa interpretação pouco usual (mas
inspirada), o autor de Hebreus conclui – a Nova Aliança envelheceu a primeira,
que está velha e prestes a acabar (8.13). Assim, fazer referência a essa
instituição em cultos neotestamentários é exaltar as sombras que passaram, que
não aperfeiçoam (10.1) e são fundadas no que é terrestre e passageiro (8.2).
6) Em Cristo, todos somos sacerdotes
Unidos a Cristo, somos tratados como portadores de
sua perfeita vida de obediência e, assim, podemos ser considerados sacerdotes.
Um dos chamados de Israel era ser um reino de sacerdotes (Êx 19.6) – justamente
a posição que Adão falhou em cumprir. O apóstolo Pedro aplica essa expressão à
igreja e afirma que somos sacerdócio real (1 Pe 2.9).
Da mesma forma que a humanidade foi chamada, no primeiro Adão, para guardar o Éden, a nova humanidade, no último Adão, é chamada a ministrar na Nova Criação. Todos os crentes são chamados a adorar e oferecer sacrifícios (Rm 12.1), não apenas uma classe especial de pessoas. É isso que chamamos de sacerdócio universal dos crentes.
Da mesma forma que a humanidade foi chamada, no primeiro Adão, para guardar o Éden, a nova humanidade, no último Adão, é chamada a ministrar na Nova Criação. Todos os crentes são chamados a adorar e oferecer sacrifícios (Rm 12.1), não apenas uma classe especial de pessoas. É isso que chamamos de sacerdócio universal dos crentes.
7) Cria uma divisão entre crentes “levitas” e
“não-levitas”
A última razão é mais prática que teológica. Em muitas igrejas, essa separação entre “ministros de louvor” e a congregação gera uma perigosa classificação de espiritualidade. É claro que pessoas que se colocam à frente da congregação (e, de certa forma, ensinam e lideram o rebanho) devem tomar um cuidado especial em relação a suas atitudes e serão responsabilizados mais rigorosamente.
Entretanto, isso não coloca necessariamente os cantores e músicos em algum tipo de posição diferente, como alguém mais consagrado, um foco maior de ataques do inimigo, imune à críticas, etc. Tanto pastores, quanto músicos e “leigos” são aceitos por Deus por meio da fé em Cristo, porque ele viveu e morreu de forma perfeita por nós. Diante de Deus, todos têm 100% de aprovação.
Ao mesmo tempo em que músicos e cantores devem estar atentos para que não caiam, eles precisam se lembrar de que a cruz nivela tudo – somos todos merecedores da ira eterna, somos todos considerados perfeitos por Deus. Em Cristo, não em Levi, todos somos templo,sacrifício e sacerdotes. Se Deus nos uniu assim, quem somos nós para separar?
A última razão é mais prática que teológica. Em muitas igrejas, essa separação entre “ministros de louvor” e a congregação gera uma perigosa classificação de espiritualidade. É claro que pessoas que se colocam à frente da congregação (e, de certa forma, ensinam e lideram o rebanho) devem tomar um cuidado especial em relação a suas atitudes e serão responsabilizados mais rigorosamente.
Entretanto, isso não coloca necessariamente os cantores e músicos em algum tipo de posição diferente, como alguém mais consagrado, um foco maior de ataques do inimigo, imune à críticas, etc. Tanto pastores, quanto músicos e “leigos” são aceitos por Deus por meio da fé em Cristo, porque ele viveu e morreu de forma perfeita por nós. Diante de Deus, todos têm 100% de aprovação.
Ao mesmo tempo em que músicos e cantores devem estar atentos para que não caiam, eles precisam se lembrar de que a cruz nivela tudo – somos todos merecedores da ira eterna, somos todos considerados perfeitos por Deus. Em Cristo, não em Levi, todos somos templo,sacrifício e sacerdotes. Se Deus nos uniu assim, quem somos nós para separar?
Nota:
1 Para uma tabela que mostra a ligação ente o Éden e o Templo/Tabernáculo, ver God’s Glory in Salvation through Judgment: a Biblical Theology, de James M. Hamilton. Boas informações também em From Eden to the New Jerusalem, de T. Desmond Alexander.
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