Um número
crescente, de igrejas neopentecostais, exibe o termo “igreja apostólica” em
referência à submissão ao “apostolado” que os seus líderes arrogam ter recebido
do próprio Deus, com base em revelações subjetivas que experenciaram. Não
advogam o apostolado da mesma forma que a Igreja católica em seu sistema papal
– sucessão ininterrupta dos apóstolos de Cristo – mas como novos apóstolos de
Jesus Cristo, laureados com revelações, como se Deus, durante todo o tempo
houvesse encoberto da Igreja, e só agora estes “apóstolos” possuíssem o saber oculto
que trará a salvação dos povos.
Os maiores influenciadores do movimento apostólico no Brasil foram Peter
Wagner e Rony Chaves, sobre eles o dr. Augustus Nicodemus, em seu livro
Apóstolos – verdade bíblica sobre o apostolado, trata com ricas informações.
Rony Chaves foi o apóstolo que ungiu ao apostolado as brasileiras Vanilce
Milhomens e Neuza Itioka (principais promotoras do movimento de batalha
espiritual). Nicodemus (2014, p. 275), denuncia uma das “pérolas” do Chaves:
Muitos apóstolos hoje, não usam o nome, título de
seu ofício ministerial. Isto só faz restringir e limitar o ministério. Quando
não se usa o termo ‘Apóstolo’, a unção não opera em toda a sua potência. A
unção flui com mais poder ao se usar corretamente o título bíblico de
“Apóstolo” para um homem chamado por Deus a este ministério. A Igreja tem tido
homens que Deus queria que fossem apóstolos e que funcionassem como tais, mas
eles não quiseram.
Ouve-se o
som da explosão de um ego inflado, no livro “Crescimento explosivo da Igreja em
Células”, quando o autor, Joel Comiskey (2013, p. 60), cita que o “apóstolo”
César Castellanos, em seus períodos de oração, recebe a “visão mundial para a
sua igreja [sic]” e assim como os apóstolos antigos, Castellanos recebe
o mérito pelo sucesso dos demais líderes em aplicar a sua inspiração e visão.
Segundo MacArthur (2015, p. 109), Peter Wagner
chega a regurgitar, dentre muitas, a seguinte heresia: “Hoje temos entrado em
outro novo odre, que eu chamo de segunda era apostólica” (grifo meu). É
com essa teologia que no ano de 2000, Wagner torna-se o apóstolo presidente da
Coligação Internacional de Apóstolos - EUA, sendo promovido em 2009 a
Presidente Apóstolo Emérito.
Interessante que para fazer parte dessa coligação,
os novos apóstolos precisam realizar pagamentos mensais, com diferentes taxas,
a depender do lugar em que vivem (MACARTHUR, 2015, p. 107-108). O Brasil conta
com o Conselho Apostólico Brasileiro, a Coalizão Apostólica Profética
Brasileira e o Projeto Transformação Brasil, além das redes apostólicas
(BEZERRA, 2017).
Análise bíblica sobre a função dos apóstolos
Inspirado por Deus, o apóstolo Paulo informou que o próprio Cristo: “deu
uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e
outros para pastores e doutores” (Efésios 4.11). No original, grego (OLIVETTI, et
al., 2015) a palavra “concedeu” está no tempo aoristo, que significa um ato
realizado de forma completa no passado; isso nos ajuda a entender que os
apóstolos e profetas foram escolhidos por Deus para compor o registro de Sua
Revelação, concluída em Apocalipse 22 e após isso, nada lhe seria acrescentado,
mas exposto pelos evangelistas, pastores e doutores.
Se fomos, como Igreja do Senhor, “Edificados (também no aoristo)
sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a
principal pedra da esquina” (Efésios 2.20), logo, partindo do fato de que não
existe novo alicerce, nem nova pedra angular em uma construção (cf. 1 Co. 3.10-11),
os apóstolos e profetas foram usados por Deus para edificar a Igreja em Cristo
e não precisamos mais de profetas e apóstolos hoje, uma vez que já possuímos a
Revelação completa, que são as Sagradas Escrituras. Corrobora com essa verdade,
o fato de a Igreja primitiva considerar, como prova de autenticidade da
inspiração divina sobre um escrito, a autoria ou influência de um apóstolo.
O trabalho dos apóstolos e profetas foi necessário para o período de
transição da antiga aliança para a nova, claro é, que nenhum dos apóstolos,
após a morte, foi substituído, com exceção de Judas, o traidor, porque o número
dos apóstolos precisava estar completo para o Pentecostes, em virtude do
simbolismo do número, representando a Igreja de Cristo, como podemos aferir mediante
alguns versículos dos Evangelhos; escrito por Mateus: “E Jesus disse-lhes: Em
verdade vos digo que vós, que me seguistes, quando, na regeneração, o Filho do
homem se assentar no trono da sua glória, também vos assentareis sobre doze
tronos, para julgar as doze tribos de Israel; escrito por Lucas: “Para que
comais e bebais à minha mesa no meu reino, e vos assenteis sobre tronos,
julgando as doze tribos de Israel (Lucas 22.30), e escatológico:
E tinha um grande e alto muro com doze portas, e
nas portas doze anjos, e nomes escritos sobre elas, que são os nomes das doze
tribos dos filhos de Israel. Do lado do levante tinha três portas, do lado do
norte, três portas, do lado do sul, três portas, do lado do poente, três
portas. E o muro da cidade tinha doze fundamentos, e neles os nomes dos doze
apóstolos do Cordeiro (Apocalipse 21.12-14).
Quanto a Paulo, ele foi o único, além dos 12, a
receber a função de apóstolo, com o propósito de anunciar Jesus Cristo aos
gentios. Paulo, de fato, viu o Cristo ressurreto e foi chamado diretamente por
Ele. Todos os apóstolos, os 12 e Paulo, viram o Cristo ressurreto. Ser
testemunha ocular da ressurreição é marca indispensável a um verdadeiro
apóstolo (Atos 1.22; 10.39-41. 1 Coríntios 9.1; 15.7-8), e Paulo afirma ter sido
a última testemunha: “por último de todos apareceu também a mim como a um
abortivo (1 Coríntios 15:8). É notória a diferença entre a teologia dos
“apóstolos” atuais e a do apóstolo Paulo. Enquanto aqueles confirmam seu
apostolado contabilizando seu sucesso, este declarava os seus sofrimentos como
qualificações principais do seu “curriculum apostólico” (cf. 2 Co
11:13-33).
No NT encontramos outras marcas do verdadeiro apostolado. Para ser
reconhecido como apóstolo, era necessário um chamado pessoal do próprio Cristo
(Marcos 3.14, Lucas 6.13, Atos 1.2,24; 10.41; Gálatas 1.1); outro critério era
a operação de sinais miraculosos (Mateus 10.1-2, Atos 1.5-8; 2.43; 5.12; 8.14,
2 Coríntios 12.12; Hebreus 2.3-4). Somente sob a autoridade dos verdadeiros apóstolos,
um escrito era considerado inspirado por Deus para compor as Escrituras
Sagradas. Segundo MacArthur (2015, p. 116):
A maioria dos que se autodenominam ‘apóstolos’ tem
a pretensão de ser especial, de ter a revelação direta de Deus. Se eles
realmente têm autoridade apostólica, o que os impede de incluírem-se na Bíblia?
Por outro lado, se apóstolos modernos não estão dispostos a incluírem-se nas
Escrituras, então o que isso diz sobre a legitimidade do seu apostolado?
Se a Bíblia não pode continuar a ser escrita, qual o sentido de uma nova
era apostólica com novas revelações para uma nova Igreja? Só se for uma falsa
Igreja com seus falsos apóstolos e suas falsas revelações. E para aquele que
acha que pode acrescentar algo às Escrituras ou escrever um livro e creditar a
mesma autoridade da Bíblia, no último capítulo do último livro do cânone está
escrito: “Declaro a todos os que ouvem as palavras da profecia deste livro: se
alguém lhe acrescentar algo, Deus lhe acrescentará as pragas descritas neste
livro”. Acréscimo na Bíblia corresponde à acréscimo ao livro de Apocalipse,
pois este foi escolhido, sob orientação do Espírito Santo, para ser o último
livro da Bíblia, seguido de mais nada. Portanto, depois dele, nenhum escrito
possui a autoridade da inspiração divina.
A liderança bíblica para a Igreja hoje é a que vemos estabelecida
nas igrejas do NT, uma liderança capacitada, composta de
bispos/presbíteros/pastores e diáconos. Em vista ao aprofundamento do estudo,
segue referências de textos bíblicos que elucidam a questão: At. 6.1-7; 11.30;
15.2.4; 6.22; 16.4; 20.17-35; 21.18; Fp 1.1; Tm 3.1-16; 1 Pe 5.1-4; Tito 1.5-9.
Como Moisés escolheu 70 homens dos anciãos de Israel para ajudá-lo a liderar o
povo no deserto, hoje nós não temos toda a igreja liderando, mas
"anciãos", que remete à função dos presbíteros, para exercerem a
liderança da igreja, na administração, no ensino e no confronto às falsas
doutrinas.
Apóstolos, além dos doze e de Paulo, relatados no
NT
Há passagens do Novo Testamento em que outras
pessoas, além dos doze e de Paulo, parecem ter sido chamadas de “apóstolos”, a
saber: Tiago, Apolo, Barnabé, Silas, Timóteo, Andrônico, Júnias, Epafrodito e
os irmãos chamados “apóstolos das igrejas”. Importa saber que o sentido em que
a palavra apóstolo foi empregada nesses casos difere do sentido em que é
empregado quando referida a Paulo e aos doze. O sentido de “apóstolos” no caso
dos que não foram testemunhas da ressurreição de Cristo, nem chamados para
lançarem o fundamento da igreja cristã, é mais amplo, entende-se por
“enviados”, “mensageiros”, “representantes”, “missionários”, pessoas designadas
pela Igreja a cumprir uma missão.
Segundo Augustus Nicodemus, (2014, p. 120-121), Barnabé (At 14.1,14; 1
Co 9.6), Silvano, Timóteo (1 Ts 1.1; 2.7) e os “demais apóstolos” que Paulo
menciona (1 Co 9.5) foram enviados por Cristo para anunciar o Evangelho em
lugares onde o mesmo não havia chegado. Epafrodito foi enviado pela igreja de
Filipos para levar uma oferta a Paulo (Fp 2.25), e os “apóstolos da igreja”
foram enviados por elas para levar uma oferta a Jerusalém (2 Co 8.23). Sendo
assim, nos nossos dias, somente poderia reivindicar esse “título” os
missionários pioneiros, desbravadores de novos campos, estes, porém, costumam
não sentir atração por títulos que os engrandeçam. “Todavia, não é neste
sentido que o movimento de restauração apostólica o emprega hoje, e sim num
significado similar aos doze e a Paulo”, dilucida Nicodemus.
O pastor inglês, Brian Edwards (2001, p. 08), no seu opúsculo: “Onde estão os
apóstolos e profetas”, elenca pontos bastante relevantes, ele diz que se fosse
tão simples a intitulação de apóstolo, Paulo não precisaria ter defendido
vigorosamente o seu apostolado ao escrever suas cartas aos coríntios e aos
gálatas; Brian analisa o versículo 5 da primeira epístola aos Coríntios e
observa que “Paulo sabia que Tiago não era um dos apóstolos, pois fez distinção
entre os ‘apóstolos’ e os ‘irmãos do Senhor’.
Segundo Edwards (2001, p. 08), de acordo com Atos 15, Tiago era um
presbítero, e não um apóstolo”, ele explica o sentido de Gálatas 1.19 com a
paráfrase: “eu não vi nenhum dos apóstolos; vi apenas Tiago, irmão do Senhor”.
Quanto à Andrônico e Júnias, apontados em Romanos 16.7 como “notáveis
entre os apóstolos”, Brian defende que eles tinham, simplesmente, uma boa
reputação entre os apóstolos. Após estas e outras observações, ele conclui:
“Não existe apóstolos hoje, a menos que levemos em conta os ‘super
apóstolos’ aos quais Paulo se referiu em 2 Co. 11. Mas ele os rejeitou como
‘falsos apóstolos’, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de
Cristo (v. 13)”.
Há ‘super apóstolos’, ainda hoje, tencionando alçar voo nas asas do
crescimento acelerado da igreja local; cabe a Igreja rejeitar os tais e
apegar-se a sã doutrina. Somente assim haverá crescimento saudável.
Referências Bibliográficas
COMISKEY,
Joel. Crescimento explosivo da igreja em células. Fortaleza, CE:
Editora Premius, 2013.
EDWARDS,
Brian. Onde estão os apóstolos e profetas. São José dos Campos, SP:
Fiel, 2001.
GOMES,
Paulo Sérgio; OLIVETTI, Odayr. Novo Testamento Interlinear Analítico
Grego-Português: texto majoritário com aparato crítico. São Paulo, Cultura
Cristã. 2ª ed, 2015.
MACARTHUR,
John. Fogo estranho. Thomas Nelson Brasil, 2015.
NICODEMUS, Augustus. Ministério Pastoral.
Campina Grande, PB: Visão Cristã, 2016.
Sobre a autora: Karoline Evangelista é aluna do Seminário Teológico Congregacional do
Nordeste. Formada em Fonoaudiologia pela Universidade Federal da Paraíba. Congrega
na Igreja Presbiteriana do Bairro dos Estados em João Pessoa-PB. Atua na área
de Apologética Cristã, escreve para a Revista Vida Cristã e é colunista no blog
Cosmovisão Cristã.
Fonte: http://www.cosmovisaocrista.com
Imagem: Google
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