Esse
é um assunto que sempre me incomodou bastante, a saber, o destino eterno
daqueles que nunca ouviram falar de Cristo. Deixando de lado se os tais ainda
existem hoje (particularmente, penso que haja) e outras questões parecidas, bem
como as várias perspectivas sobre o assunto, vou logo resumir a minha posição: todos os eleitos, fatalmente,
ouvirão acerca de Cristo por meio da pregação da Sua Palavra. Nem todos os que
ouvem são eleitos, obviamente, mas todos os eleitos ouvirão. Ainda que digamos
que cabe somente a Deus julgar tais pessoas, não somos autorizados, pelas
Escrituras, a pensar que poderá ser salvo quem nunca ouviu de acerca de Cristo,
uma vez que "a fé vem pelo ouvir" (Rm 10.17), sendo esta mesma fé um
dom de Deus exclusivamente para os Seus eleitos (cf. Tt 1.1). Estes, por sua vez,
vem a Cristo pela pregação (cf. 2 Ts 2.13, 14).
Há de se questionar em que consiste
essa "pregação". De pronto, rejeito a perspectiva segundo a qual a
revelação geral (criação, cultura, moralidade, etc.) é suficiente para a
salvação, pois, se assim fosse, a fé em Cristo seria necessária apenas para
alguns (sinceramente, não creio na revelação geral nem como meio salvífico
extraordinário). Nesse quesito, penso em Cornélio, centurião romano sobre o
qual se diz ter sido "piedoso e temente a Deus" (At 10.2), mas que precisou
ouvir explicitamente acerca de Cristo por intermédio do apóstolo Pedro para ser
salvo (ver todo o capítulo 10 de Atos). Rejeito, também, a noção segundo a qual
a pregação pode ser entendida como o exemplo de vida dos cristãos
("conversão pelo exemplo", tão propagada pelos pietistas e místicos
medievais), pois nossas vidas não podem ser melhores do que a pregação viva da
Palavra de Deus.
Há, ainda, um equívoco a ser
corrigido, e este tem a ver com a relação entre Decreto e Providência.
Novamente citando o caso de Cornélio (somente para não citar todos os eleitos),
não podemos dizer que ele já era salvo antes de ouvir a Palavra. Pelo decreto,
sim, ele já constava entre os eleitos, mas não pela Providência, haja visto não
ter chegado ainda o tempo da concretização do decreto. E o que é a Providência,
senão os meios que Deus usa para alcançar aquilo que Ele decretou? Nesse caso,
Cornélio precisou, na História, ouvir a Palavra, sendo regenerado pelo Espírito
para que pudesse, então, crer e ser salvo.
Assim sendo, creio ser a pregação o
meio providencial responsável por infundir fé no coração do eleito. Só a pregação? Bem,
como já falei acima, se há exceções elas não são especificadas pelas
Escrituras, pelo que me reservo ao direito de me ater apenas àquilo que nos é
afirmado pela Revelação como regra, em vez de especular sobre a exceção. E me
valho, aqui, do pertinente comentário de Calvino a Romanos 10.14 (..."e
como ouvirão, se não há quem pregue?"). Ele diz que "o que Paulo está
descrevendo aqui é somente a palavra pregada, pois este e o modo normal que o
Senhor designou para comunicar sua Palavra. E se se argumenta, à luz desse
fato, que Deus não pode dar-se a conhecer entre os homens só por meio da
pregação, então
negaremos que isto era o que o apóstolo pretendia transmitir. Ele
estava transferindo somente a ordinária
dispensação divina, e não
pretendia escrever uma lei à sua graça" (ênfase minha). E me é
muito claro, ainda na Escritura, que Deus sempre envia Seus arautos para os
lugares em que há eleitos Seus para serem alcançados (cf. At 18.10; 13.48;
Jonas e os ninivitas, etc.). Novamente citando o reformador francês (agora em
seu comentário a Romanos 10.15 - "e como pregarão se não forem
enviados"), "quando alguma nação é agraciada com a pregação do
evangelho, tal fato é uma garantia do amor divino".
Por último, não penso que este seja o
típico assunto que deva ser relegado apressadamente ao "mistério",
como se as provas bíblicas acerca dele fossem insuficientes ou inexistentes. O
máximo que posso dizer quanto aos que nunca ouviram é que cada um será julgado
de acordo com a resposta que deu à luz que teve, mas não para uma possível
absolvição. Para o quê, então? Bem, embora eu tenda a crer aqui em possíveis
níveis de sofrimento no inferno (cf. passagens como Mt 11.22, 24; Lc 12.47, 48;
20.17), prefiro não arriscar ir além daquilo sobre o que a Escritura não lança
senão faíscas.
Fonte: http://5calvinistas.blogspot.com.br/
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