Por Pr. Silas Figueira
Texto base: Lucas 4.14-30
INTRODUÇÃO
Após ser batizado por João, o Espírito Santo veio sobre Jesus e Ele, cheio do Espírito Santo, foi conduzido ao deserto para ser tentado pelo diabo (Mt 4.1; Lc 4.1,2). Após a tentação, Lucas nos diz que Jesus voltou para a Galileia. No entanto, é importante destacar que Lucas não registra outros fatos que ocorreram nesse período. Por exemplo, entre Lucas 4.13 e 4.14,15 é provável que houve um intervalo de um ano, durante o qual ocorreram os fatos relatados em João 1.19-4.42.
Dentre esses fatos podemos destacar a convocação dos primeiros seis discípulos para o seguirem e quando Jesus foi para Caná na Galileia onde transformou água em vinho (Jo 2.1-11), de lá peregrinou por toda a Galileia, atingindo também Cafarnaum (Lc 4.23). Após esses e outros fatos ocorridos, o Senhor rumou para Nazaré. Podemos destacar que Mateus, Marcos e Lucas começam o ministério de Jesus com a Galileia; João registra um ministério anterior na Judéia.
Este período do ministério de Jesus foi chamado a Primavera Galileia. Tinha chegado como um sopro do próprio vento de Deus. A oposição ainda não se tinha cristalizado. Os corações dos homens estavam famintos de palavras de vida. A fama de Jesus crescia e todos o ouviam com alegria.
Ainda como introdução, devemos destacar que o v. 14 tem uma ligação muito importante com o v. 1. Lucas destaca que Jesus estava “cheio do Espírito Santo” (Lc 4.1), e agora nos diz que Jesus guiado pelo Espírito Santo (Lc 4.14) voltou para a Galileia. Essa visão da atuação de Jesus no contexto da ação do Espírito Santo é particularmente peculiar ao Evangelho de Lucas.
Nos cap. 1-3 observe como Lucas é enfático sobre a ação do Espírito Santo em muitas ocasiões. Em Lc 1.15,17 (nos diz que João Batista seria cheio do Espírito Santo desde o ventre); em Lc 1.35 (Maria ficaria grávida pela virtude do Espírito Santo); em Lc 1.41 (Isabel ficou cheia do Espírito Santo com a saudação de Maria); em Lc 1.67 (Zacarias profetiza cheio do Espírito Santo); em Lc 1.80 (nos diz que João crescia cheio do Espírito Santo); em Lc 2.25-27 (nos fala de Simeão, homem cheio do Espírito Santo); em Lc 2.40 (nos fala que Jesus crescia cheio do Espírito Santo); Lc 3.16 (Jesus batiza com o Espírito Santo); Lc 3.22 (o Espírito Santo revestiu Jesus de poder); Lc 4.1 (nos diz que Jesus estava cheio do Espírito Santo); Lc 4.14 (Jesus é guiado pelo Espírito Santo); 4.18 (na Sinagoga, Jesus anuncia a sua missão pela força do Espírito Santo), e em Lc 24.49 (temos a promessa de Jesus sobre a presença do Espírito Santo junto aos discípulos que ocorreu em Atos 2).
Sem a ação do Espírito Santo não podemos realizar a obra do Senhor e, por mais que façamos, sem o Espírito Santo, nossas obras não passarão de obras mortas e infrutíferas. Como disse Jesus: “Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se alguém permanecer em mim e eu nele, esse dará muito fruto; pois sem mim vocês não podem fazer coisa alguma” (Jo 15.5).
Quais as lições que podemos tirar desse texto para nós hoje?
1 – OS NAZARENOS ESTAVAM EMPOLGADOS COM A FAMA DE JESUS (Lc 4.14,15).
Antes de Jesus ir para sua cidade natal, Ele percorreu a Galileia pregando a palavra e operando sinais e prodígios. Ali em Nazaré as pessoas não só conheciam a família de Jesus como também a excelência do caráter de Jesus. Ao sair de Nazaré, Jesus foi morar em Cafarnaum após ter sido batizado por João Batista no rio Jordão, e começou seu ministério pregando o Evangelho do Reino e operando muitas maravilhas.
Os habitantes de Nazaré, por certo, comentavam entre si: “Ele não deixará de vir visitar os seus familiares; quando Ele vier, nós ouviremos o que o filho do carpinteiro tem a dizer”. Provavelmente havia um interesse em escutar um dos jovens da aldeia quando este se tornava pregador, e esse interesse foi aumentando pela esperança de ver maravilhas, do tipo realizado em Cafarnaum. Mas provavelmente havia um interesse ainda maior, a possibilidade de Jesus passar a morar novamente em Nazaré e torná-la uma cidade famosa entre as cidades das tribos; assim atrairia uma multidão de fregueses às lojas locais, ao tornar-se o Grande Médico de Nazaré! [1]
O grande operador de milagres da região! Nazaré, provavelmente, se tornaria um lugar de peregrinação. Quantas vantagens os moradores teriam hospedando os peregrinos, assim como o comércio e os comerciantes teriam com Jesus entre eles. Quanto dinheiro eles ganhariam! Isso não lhes soa familiar?
Não tem sido diferente nos dias de hoje. O Jesus famoso tem sido seguido e querido por muitos. Mas qual Jesus que a multidão quer conhecer na verdade?
a) Muitos querem conhecer o Jesus que ouviram o falar, mas não o Jesus que se revela nas Escrituras. “Jesus respondeu-lhes e disse: Na verdade, na verdade vos digo que me buscais, não pelos sinais que vistes, mas porque comestes do pão e vos saciastes” (João 6.26).
b) Muitos querem um Jesus da moda. Um Jesus Pop Star. Um Jesus das multidões, mas não o Jesus que os confronta com a verdade. “Muitos, pois, dos seus discípulos, ouvindo isto, disseram: Duro é este discurso; quem o pode ouvir?” (João 6.60).
c) Muitos querem um Jesus que opera sinais e prodígios, um Jesus milagreiro, mas não o que ensina: “Venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu” (Mt 6.10), onde a primeira e a última palavra é do Senhor e não a do homem.
d) Muitos querem um Jesus que compreende os seus pecados, mas que não os manda deixá-los. “Vai-te, e não peques mais” (Jo 8.11).
e) Muitos querem um Jesus que promete o céu independentemente deles o terem como Senhor de suas vidas. “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1.12,13).
f) Muitos querem o Jesus da Teologia Liberal. Um Jesus sem dogmas, sem leis, sem Evangelho, sem cruz. “Então disse Jesus aos seus discípulos: Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me” (Mt 16.24).
Esse Jesus famoso tem atraído muitas pessoas. E não faltam pregadores apresentando esse falso Cristo as multidões. Como disse John Piper: “Existe uma fé fingida que só quer escapar do inferno e que não tem nenhum desejo por Cristo. Essa fé não salva”.
2 – OS NAZARENOS ESTAVAM FAMILIARIZADOS COM JESUS FILHO DE JOSÉ E MARIA, MAS NÃO COM O MESSIAS (Lc 4.16,22).
O texto que lemos nos diz que Jesus foi para Nazaré onde fora criado. Todos ali o conheciam muito bem, assim como toda a sua família. Vemos isto nas próprias palavras das pessoas dando testemunho desse fato: “Não é este o filho do carpinteiro? Não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos, Tiago, José, Simão e Judas? Não vivem entre nós todas as suas irmãs?” (Mt 13.55,56); “Todos lhe davam testemunho, e se maravilhavam das palavras de graça que lhe saíam dos lábios, e perguntavam: Não é este o filho de José?” (Lc 4.22).
Creio que este tem sido um dos grandes problemas que temos enfrentado nessa geração. As pessoas conhecem tudo a respeito de Jesus. Tem muita intimidade com Ele por terem sido criados na igreja. Mas essa intimidade, muitas vezes, não gera temor, mas afinidade. É como se Jesus fosse de casa. Uma pessoa da família. Assim estavam os moradores de Nazaré.
- Jesus é amigo dos meus filhos. Não saía aqui de casa.
- Saiu daqui da cidade esses dias e já está famoso. Sabia que esse menino ia longe.
- Quem diria que o filho da Maria chegaria onde chegou.
Essas e outras coisas, certamente, os moradores de Nazaré falaram a respeito de Jesus. Os moradores de Nazaré eram as que mais sabiam a respeito de Jesus. Mas saiba de uma coisa, saber coisas a respeito de Jesus não faz de você um de seus discípulos. Podemos saber tudo a respeito de alguém e mesmo assim não ser íntimo dessa pessoa.
É o que temos visto em muitas igrejas hoje. Há uma intimidade grande com Jesus amigo, mas falta temor ao Jesus Senhor. Ao Deus encarnado. Ao justo Juiz. Sabem tudo a respeito dele, mas não o tem como Senhor de suas vidas.
Mais uma vez repito, esse tipo de conhecimento gera, muitas vezes amizade, mas não gera temor. Foi o que aconteceu com os filhos do sacerdote Eli. Em 1 Samuel 2.12 nos diz: “Eram, porém, os filhos de Eli filhos de Belial; não conheciam ao Senhor”. No entanto eles exerciam o sacerdócio. O mesmo aconteceu com os filhos de Samuel (1Sm 8.1-3).
Não basta ser amigo de Jesus, temos que tê-lo como nosso salvador e Senhor.
Isso ocorreu com John Wesley. Os irmãos John e Charles Wesley, pastores anglicanos, embora muito bem intencionados, fracassaram em sua viagem missionária aos Estados Unidos, que durou apenas 18 meses. Frustrado e deprimido, John Wesley exclamou: “fui à América evangelizar os índios, mas quem me converterá?”.
Durante uma grande tempestade na travessia do Oceano Atlântico, ficou profundamente impressionado com a confiança e tranquilidade demonstradas por um grupo morávio de cristãos pietistas que alegremente cantavam e louvavam ao nome de Jesus diante da perspectiva da morte. Tal atitude contrastava com os sentimentos de medo da morte e do juízo final. Tais experiências são o início de uma crise que o levaria a uma grande descoberta!
Foi somente no dia 24 de maio de 1738, numa pequena reunião, ouvindo a leitura de um antigo comentário escrito pelo reformador Martinho Lutero sobre a Carta aos Romanos, que John Wesley sentiu seu coração aquecer-se de modo sublime, por haver compreendido perfeitamente a essência do Evangelho de Cristo, renunciando toda confiança em suas próprias obras e passando a confiar inteiramente no Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.
Esta chama acesa no coração de Wesley não foi fogo de palha! Tal experiência produziu uma verdadeira revolução e mudou sua perspectiva do Evangelho e da missão da Igreja. Wesley tornou-se um pregador fervoroso e incansável da justificação pela fé na cruz de Cristo e do poder do Espírito Santo para transformação e santificação de indivíduos e comunidades inteiras.
3 – OS NAZAREMOS REJEITARAM A MENSAGEM DE JESUS (Lc 4.16-27).
No tempo devido, Jesus veio até a cidade de Nazaré, e num sábado, Jesus vai à sinagoga local e ali lhe é entregue o livro do profeta Isaías. E em pé lê a passagem de Isaías 61.1,2a; após lê-lo, devolveu-o ao chefe da sinagoga, passando a dizer que aquela passagem bíblica havia se cumprido – “Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos” Lc 4.21.
Mas o que me chama a atenção é que o Senhor não leu todo o versículo, mas deixou de ler a passagem que diz respeito ao “dia da vingança do nosso Deus”. Provavelmente porque a porta da graça estava aberta, no entanto, no tempo certo ela será fechada.
Lucas nos diz que todos ficaram maravilhados com as palavras de graça que saiam de seus lábios (Lc 4.22), isto é, ficaram maravilhados com a Sua maneira atraente de falar.
No entanto, a curiosidade e admiração se transformaram em ódio.
a) Quando o Senhor lê o texto e explica o texto, dizendo que o texto de Isaías estava se cumprindo naquele momento. Jesus está dizendo que Ele era o Messias prometido (Lc 4.21,22). Diane dessa revelação o semblante dos seus ouvintes mudou. Mas como poderia ser isso? Ele era o filho do carpinteiro, eles conheciam a sua mãe e irmãos. Ele fora criado entre eles. Isso não poderia ser verdade.
b) Quando Jesus aplica o texto dizendo cita dois provérbios: “Médico, cura a ti mesmo” e “Nenhum profeta é bem recebido na sua pátria”.
Depois de citar os provérbios, Jesus diz que não podia fazer ali os sinais que foram feitos em Cafarnaum por causa da dureza do coração deles (Mt 13.57,58). Jesus diz que eles eram piores que os gentios quando fala a respeito da bênção que a viúva de Sarepta da região de Sidom havia recebido pelo ministério de Elias, uma cananéia, dentre os cananeus malditos. Mas não para por aí. Jesus fala a respeito de Naamã, o sírio, que fora curado de lepra por Eliseu, sucessor de Elias.
Imediatamente eles se colocaram de pé e intentaram matar o pregador. Eles conheciam Jesus, mas era um conhecimento separado da fé. Assim como ocorreu no tempo de Elias e Eliseu estava ocorrendo ali entre os nazarenos. Eram pessoas de coração duro.
Em João 5.43-47 o Senhor falou assim: “Eu vim em nome de meu Pai, e não me recebeis; se outro vier em seu próprio nome, certamente, o recebereis. Como podeis crer, vós os que aceitais glória uns dos outros e, contudo, não procurais a glória que vem do Deus único? Não penseis que eu vos acusarei perante o Pai; quem vos acusa é Moisés, em quem tendes firmado a vossa confiança. Porque, se, de fato, crêsseis em Moisés, também creríeis em mim; porquanto ele escreveu a meu respeito. Se, porém, não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?”
A incredulidade dos nazarenos estava jogando fora a oportunidade que o Senhor lhes estava dando. Tanto que o Senhor não ficou mais ali, foi embora. A oportunidade da salvação fora jogada fora. A oportunidade de verem se abrir as portas do céu para eles.
Eles jogaram fora a oportunidade de o Senhor operar milagres entre eles. Mateus nos diz que o Senhor não pode realizar muitos milagres ali por causa da incredulidade deles (Mt 13.58). Como é desastroso o pecado da incredulidade. A incredulidade rouba do povo as maiores bênçãos.
Uma das coisas que temos observado hoje em muitas igrejas é que muitas pessoas querem ouvir uma palavra de bênção, mas não querem ouvir a aplicação para suas vidas. Assim como os nazarenos, muitos dão honra aos de fora, mas não dão honra aos seus. O pastor prega todos os domingos e poucos lhe dão ouvidos, mas quando vem alguém de fora e fala a mesma coisa que o pastor local tem falado lhe dão crédito. O tempo passa, mas os homens não mudam!
4 – OS NAZARENOS QUISERAM MATAR JESUS (Lc 4.28-30).
As pessoas de Nazaré ficaram com ódio de Jesus por Ele ter-lhes dito que o Espírito do Senhor estava sobre Ele. Que Ele era o Messias prometido. E quando Ele disse que eles eram inferiores aos gentios, por causa da incredulidade deles. A hostilidade deles não ficou apenas no campo do sentimento. Eles expulsaram Jesus de Nazaré e o levaram até o monte para o precipitarem de lá para baixo.
Imaginar que fossem piores que as viúvas fenícias e leprosos sírios! Sua ira não conhecia limites. A casa de oração e adoração se transformou numa casa de loucos. Precipitam-se sobre o orador. Porventura não é ele um falso profeta? E a lei não exige que esse tipo de enganadores sejam mortos? Veja Deuteronômio 13.1-5. Arrastaram-no até à colina sobre a qual a cidade estava construída – alguns presumem que era o penhasco localizado no canto sudoeste da cidade, o que sobressaía do convento maronita - com a intenção de precipitá-lo de ponta-cabeça nas rochas abaixo.
Os nazarenos não conseguiram matar o Senhor da vida, mas os mantiveram mortos em seus delitos e pecados. A incredulidade é o mais velho pecado do mundo. Ela começou no Jardim do Éden, onde Eva creu nas promessas do diabo, em vez de crer na Palavra de Deus. A incredulidade traz morte ao mundo. A incredulidade manteve Israel afastado da terra prometida por quarenta anos. A incredulidade é o pecado que especialmente enche o inferno: “Quem, porém, não crer será condenado” (Mc 16.16).
Entenda uma coisa, a Palavra de Deus não é para massagear o ego humano. A Palavra de Deus é como um bisturi que tem por finalidade expor nossa condição espiritual e nos trazer cura ou condenação (Hb 4.12).
No entanto, as pessoas preferem matar Jesus a lhe darem ouvidos. Foi assim no passado e tem sido nos dias de hoje. Os maiores auditórios, em muitas igrejas, tem sido onde a Palavra de Deus tem sido pregada de forma vazia e não de forma plena. Muitos preferem ouvir uma meia verdade e continuarem presas no pecado a ouvir a palavra que liberta.
A verdade implica em responsabilidade e fé. A mentira não implica em nada.
CONCLUSÃO
Ser simplesmente familiarizado com Jesus, certamente, não lhe levará ao céu. Muitas pessoas estão tendo um relacionamento de amizade com o Senhor. Se você está assim convido-o a deixar de ser amigo de Jesus e tornar-se um servo fiel a Ele. Talvez você tenha se acostumado com o sagrado, com os cânticos, com as orações e pregações. Talvez você seja como aquele jovem rico, ou quem sabe como Uzá e Aiô, mas eu lhe convido hoje a ser como Maria, uma pessoa totalmente consagrada a Deus por ser uma verdadeira serva do Senhor.
Pense nisso!
1 – Spurgeon, C. H. Os Milagres de Jesus, São Paulo, Ed. Shedd, 1ª reimpressão 2011, p. 51Fonte: http://ministeriobbereia.blogspot.com
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