O
paralelo entre o espiritual e o material (ou social) há séculos é interpretado
de diversas maneiras. A grande dificuldade é em saber quais os limites entre a
vida espiritual de um adepto, e sua realidade social. De forma geral, todas as
religiões interferem de alguma forma no cotidiano de seus seguidores.
Questões associadas à
vestimenta, à alimentação, ao entretenimento são discutíveis em grupos
religiosos pertencentes, por exemplo, ao cristianismo e ao islamismo. Outras
restrições, como a do acesso aos meios de comunicação (televisão, rádio,
revistas) e a publicação de listas de “livros proibidos” aos membros ou
cidadãos de um país confessional, também são interferências diretas na forma de
vida dos indivíduos.
No
Irã – e em outros países islâmicos confessionais, dirigidos com base na Sharia
– a religião não é simplesmente um elemento social, parte de um contexto geral
da sociedade, mas permeia todos os aspectos sociais dos iranianos, com
restrições e punições igualmente severas. A execução de 16 rebeldes opositores,
neste sábado (26), no Irã, e a postagem de vídeos por uma muçulmana dirigindo,
na Arábia Saudita – é proibido às mulheres dirigirem -, são dois exemplos
recentes. De forma semelhante, a religião também é usada em alguns países
ocidentais como um mecanismo de controle, de influência política.
Mesmo
com o avanço da democracia, da laicidade do Estado, a religião ainda é um
elemento que exerce forte influência em governos, em discussões de abrangência
universais. Há séculos o Catolicismo Romano se utiliza de mecanismos de
submissão, seja quando das cruzadas, das inquisições, dos cerceamentos
científicos, da indução ao belicismo e aos conflitos étnicos.
Aspectos
constitucionais, das leis, em muitas ocasiões são desrespeitados por
denominações religiosas, como os que praticam a poligamia nos EUA (ver Igreja
Fundamentalista de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias), ou que induzem
seus membros a doarem mais do que o necessário para à manutenção de sua
estrutura organizacional. Neste segundo aspecto, o neopentecostalismo
brasileiro se destaca pelo o fato de que exerce forte domínio psicológico sobre
seus adeptos.
O
fanatismo religioso – particularmente no que se refere às igrejas pentecostais
extremistas, a exemplo da Igreja Deus é Amor, Sinos de Belém Missão das
Primícias e Congregação Cristã no Brasil, para citar algumas igrejas – se
traduz pelo o que o membro pode ou não fazer ou ser. Por exemplo, a
persistência da IPDA em proibir o acesso à televisão, à vestimenta já adotada
por outras igrejas, à prática esportiva e ao entretenimento, interfere de forma
radical na vida de seus membros.
Apesar
das restrições impostas pela IPDA, a tendência é de que, futuramente, ocorram mudanças
semelhantes as que vêm ocorrendo nas Assembleias de Deus – particularmente
desde que a televisão e os usos e costumes foram liberados aos membros. A
dificuldade de assimilação dos limites entre o espiritual e o social é um sério
problema porque gera transtornos dificilmente irreparáveis na medida em que a
capacidade crítica, de vivência social, de um fiel é seriamente prejudicada e
limitada.
Há
questões econômicas, de controle, por trás do fanatismo religioso que
ultrapassa os limites pentecostais, cristãos, e que são perceptíveis na forma
como organizações com forte atuação no Brasil (como as Testemunhas de Jeová) se
articulam no cenário religioso. Nas TJ, a maneira quase militarizada como seus
membros são organizados, e a influência exercida sobre as famílias (inclusive
com proibições de contato com membros disciplinados – a preguiça também é tida
como aspecto passível de disciplina) são retratados em filmes como To Verdener
(Mundos Separados).
Produzido
pelo dinamarquês Niels Arden Oplev, em 2008, To Verdener retrata a história de
Sara (Rosalinde Mynster), uma jovem de 17 anos que foi criada com base nos
ensinos das Testemunhas de Jeová, e que se vê em situação de conflito após
iniciar um relacionamento com o ateu Teis (Johan Philip Asbaek). Disciplinada
pelos anciões de sua congregação, Sara passa a ser rejeitada por sua própria
família. O enredo, baseado em uma história verídica, é algo comum nas TJ.
Manipulação,
restrições, cerceamentos, mortificações, são mecanismos de controle
psicológico, característico de grupos destrutivos, e que visam explorar
financeiramente adeptos. Novamente, todas as religiões possuem algum nível de
influência no cotidiano de seus membros, mesmo que em alguns casos de forma não
perceptível ou racional. Neopentecostais, pseudocristãos, são citados como
exemplos, mas há inúmeros outros que se enquadram na proposta de análise da
matéria.
Resumindo,
o ponto principal a ser tomado como foco de análise é até que ponto uma
religião pode interferir na vida de um adepto? Restrições como a de acesso a
livros, a da ingestão de certos alimentos (como café e chá preto, no caso do
Mormonismo), à participação em eventos festivos, recreativos ou de
entretenimento (como no caso de algumas igrejas pentecostais, a exemplo da
IPDA), de inserção em cursos universitários (como no caso das Testemunhas de
Jeová), e aos direitos da mulher (como no caso do islamismo), são questões a
serem investigadas mais de perto.
Fonte: napec.org
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