MATEUS 23:37 – Jerusalém,
Jerusalém, você, que mata os profetas e apedreja os que lhe são enviados!
Quantas vezes eu quis reunir os seus filhos, como a galinha reúne os seus
pintinhos debaixo das suas asas, mas vocês não quiseram. (NVI)
Quando os Arminianos atacam as doutrinas bíblicas
da soberania divina, eleição, reprovação, e assim por diante, este é um dos
versículos que eles frequentemente mencionam para apoiar a posição deles. O que
Jesus “queria” não foi realizado porque as pessoas “não estavam querendo”.
Supostamente isto mostra que o homem possui um livre-arbítrio que pode se opor
à vontade divina, de forma que o desejo de Deus pode finalmente ser frustrado,
e sua graça pode ser resistida com sucesso. O que se segue não oferecerá uma
exposição positiva do sistema bíblico, mas apenas mostrará que este versículo
não pode ser usado para apoiar o Arminianismo.
Quanto ao esquema chamado Calvinismo, podemos
distingui-lo entre duas formas. Chamaremos um de visão bíblica ou consistente,
e o outro de visão popular ou inconsistente.
O Calvinismo consistente afirma com a Escritura que
a soberania divina é incompatível com a liberdade humana, e visto que a
Escritura ensina que Deus é absolutamente soberano, isto exclui e destrói
completamente a liberdade humana. O homem não tem nenhum livre arbítrio; ele
não é livre de forma alguma. É verdade que o homem exerce sua vontade – ele faz
decisões – mas sua vontade não é livre. Antes, sua vontade – como ele faz
decisões e quais decisões ele faz – é direta e constantemente controlada por
Deus tanto para o bem como para o mal, tanto para a fé como para a
incredulidade. E Deus é justo por definição em todas as ações que ele realiza
sobre as criaturas. Eu já ofereci exposições completas deste esquema bíblico em
outros lugares.
Então, há a forma popular de Calvinismo. Este é a
visão inconsistente que diz que a soberania divina e a liberdade humana são
“compatíveis” em algum sentido; que a responsabilidade moral pressupõe em
alguma medida ou sentido uma “autodeterminação”; que Deus tem desejos que
contradizem uns aos outros, que Deus faz com que os decretos divinos causem
coisas o que ele deseja, talvez para estabelecer o que ele mais deseja;
que Deus pode decretar a reprovação de indivíduos, tornando impossível que eles
creiam, mas ainda oferecer “sinceramente” a salvação a eles, se eles puderem
crer; que Deus de alguma forma governa o mal, mas não tem relação causativa
direta para com ele; que Adão foi criado inocente e sem mal, mas pôde de alguma
forma realizar o mal, sem Deus fazer com que ele agisse assim; que podemos
afirmar a realidade do mal, mas negar que Deus exerce algum poder causativo
direto sobre ele e ainda assim evitar de alguma forma cair num deísmo ou
dualismo; que podemos afirmar ambos os lados de uma contradição “aparente”, e
que a Escritura ensina doutrinas “aparentemente” contraditórias que não são
contradições reais na mente de Deus. Não faremos nenhuma tentativa para
defender este pacote antibíblico e irracional de confusão.
Começaremos observando o contexto no qual nosso
versículo aparece. Aconselho que você leia Mateus 23 em sua inteireza antes de
continuar lendo, mas se te faltar a paciência, pelo menos leia-o após ler esta
exposição. Isso te ajudará a captar melhor os pontos que estabeleceremos. Lucas
13:34 é um versículo paralelo. Ali o contexto, em termos do assunto levantado
pelos versículos em volta, é similar o suficiente, de forma que ele não demanda
um tratamento separado. E por causa disto, eu não prestarei nenhuma atenção a
este outro versículo em nossa discussão. Após termos completado nossa discussão
sobre Mateus 23:37, você não terá nenhum problema com Lucas 13:34.
O capítulo começa, nos versículo 1-12, com Jesus
fazendo algumas considerações sobre a hipocrisia dos escribas e fariseus. Ele
diz que até onde eles ensinavam a lei, as pessoas deveriam obedecer. Então, ele
adiciona: “Obedeçam-lhes e façam tudo o que eles lhes dizem. Mas não façam o
que eles fazem, pois não praticam o que pregam. Eles atam fardos pesados e os
colocam sobre os ombros dos homens, mas eles mesmos não estão dispostos a
levantar um só dedo para movê-los” (v. 3-4).
Nos versículo 13-32, ele pronuncia sete “ai’s”
sobre eles, citando as acusações que ele tinha contra eles juntamente com cada
“ai”. Esta porção do capítulo é essencial para um entendimento apropriado do
versículo 37. À medida que você ler estes versículos, observe como Jesus
pronuncia um “ai” após o outro, e observe a intensidade com que ele faz isso.
Então observe a quem ele está dirigindo estes “ai’s” de uma
maneira dura: “Ai de vocês, escribas e fariseus,
hipócritas!”. Observe todas as ocorrências nas quais ele dirige suas
declarações a “vocês” – os escribas e fariseus. Preste atenção especial ao
versículo 13, que diz: “Ai de vocês, escribas e fariseus,
hipócritas! Vocês fecham o Reino dos céus diante dos homens! Vocês mesmos
não entram, nem deixam entrar aqueles que gostariam de fazê-lo”.
Então, nos versículos 33-36, ele os identifica com
aqueles que, por toda a história de Israel, tinham matado os profetas que Deus
enviava ao povo. Ele diz: “E, assim, sobre vocês recairá
todo o sangue justo derramado na terra... Eu lhes asseguro que tudo isso sobrevirá
a esta geração” (v. 35-36). Sem dúvida, ele está se
referindo à destruição iminente do templo. O contexto comprova isto, visto que
vários versículos adiante, lemos: “Jesus saiu do
templo e, enquanto caminhava, seus discípulos aproximaram-se dele para
lhe mostrar as construções do templo. ‘Vocês estão vendo tudo isto?’, perguntou
ele. ‘Eu lhes garanto que não ficará aqui pedra sobre pedra; serão todas
derrubadas’” (Mateus 24:1-2). Esta predição foi cumprida em 70 d.C., isto é, na
mesma geração a qual Jesus ministrou e pregou, e a mesma geração que o
assassinou. As pessoas foram massacradas e o templo foi destruído.
Jesus não mudou o assunto quando ele chega ao
versículo 37. O versículo seguinte ainda se refere à destruição do templo: “Eis
que a casa de vocês ficará deserta” (v.38). De fato, como já observamos, ele
ainda está no mesmo assunto com o qual Mateus 24 começa. E é com este pano
de fundo em mente que deveríamos ler nosso versículo: “Jerusalém, Jerusalém,
você, que mata os profetas e apedreja os que lhe são enviados! Quantas vezes eu
quis reunir os seus filhos, como a galinha reúne os seus pintinhos debaixo das
suas asas, mas vocês não quiseram”.
Aqui “Jerusalém” não se refere à cidade física, ou
a toda pessoa considerada individualmente na cidade. “Jerusalém” é dita ser
aquela que “mata os profetas”, e no contexto, aqueles que matariam os profetas
são os líderes do povo – incluindo os escribas e fariseus. Eles imitam seus
antepassados que “assassinaram os profetas” (ver v. 29-32). No versículo 34,
Jesus diz que ele está prestes a enviá-los profetas e mestres, e estes lideres
iriam maltratá-los assim como os seus antepassados maltrataram os antigos
profetas: “Por isso, eu lhes estou enviando profetas, sábios e mestres. A uns
vocês matarão e crucificarão; a outros açoitarão nas sinagogas de vocês e
perseguirão de cidade em cidade”.
Quanto aos “filhos” no versículo 37, naturalmente
eles eram as pessoas que viviam sob a autoridade e direção destes líderes.
Líderes religiosos e políticos são algumas vezes chamados de “pais” na
Escritura (Atos 7:2, 22:1), e aqueles sobre quem eles exercem poder e
influência são chamados de “filhos” (Mateus 12:27; Isaías 8:18). Deveríamos
observar primeiro, então, que este versículo não pode se referir à disposição
ou à fé de indivíduos para aceitar o evangelho, pois de outra forma o versículo
deveria dizer: “Eu quis reunir vocês... mas vocês não
quiseram”, ou “eu quis reunir os seus filhos... mas seus
filhos não quiseram”. Mas o versículo diz: “Eu quis reunir
os seus filhos... mas vocês não
quiseram”. Não foram os “filhos” que resistiram, mas o “vocês” que resistiram
para evitar os “filhos” de serem reunidos. O versículo, portanto, está se
referindo à mesma coisa já mencionada no versículo 13: “Vocês mesmos não
entram, nem deixam entrar aqueles que gostariam de fazê-lo”.
Os Arminianos podem afirmar a liberdade humana e
negar que Deus controla diretamente uma pessoa para crer ou descrer. Mas tendo
negado o controle a Deus, supomos que nem mesmo eles são tolos o suficiente
para então voltar e atribuir a líderes humanos políticos e
religiosos o controle interno direto sobre as mentes do povo, como se os
fariseus possuíssem maior controle do que Deus sobre as pessoas, de forma que
eles poderiam ter misericórdia de quem quisessem ter misericórdia, e endurecer
a quem eles desejassem endurecer. Não, é evidente que os versículos 13 e 37
estão se referindo a como os líderes humanos impediam os profetas sobre um
nível puramente humano e externo, para evitar que a mensagem deles chegasse até
o povo, e para evitar que o povo abraçasse tal mensagem. Jesus está falando
sobre uma influência social e externa, não de um poder metafísico e interno.
Segue-se, então, que o “eu quis” no versículo 37
está se referindo ao relacionamento de Jesus com aqueles líderes e o povo deles
sobre um nível humano e externo. Não há nenhuma indicação neste versículo de
que o desejo divino ou o decreto divino pode ser resistido com sucesso simplesmente
porque alguém “não está querendo”. A Bíblia é clara sobre o ensino de que, se
alguém está indisposto, é porque Deus o tornou indisposto
(João 12:40; Romanos 9:18, 11:7), e se alguém está disposto, é porque Deus
o tornou disposto (João 6:44, 65). Ninguém que Deus torne
indisposto pode vir (João 6:44), e ninguém que Deus torne disposto pode recuar
(João 6:37).
Uma objeção que pode se levantar é que o que é
atribuído ao “eu” aqui não pode ser realizado por Jesus considerando-se um nível
puramente humano. Mas em quase outro contexto, talvez numa discussão sobre a
deidade de Cristo, até mesmo os Arminianos admitiriam que como Deus-homem, a
Escritura nem sempre distingue meticulosamente o que é atribuído à sua natureza
divina e o que é atribuído à sua natureza humana. Nós podemos fazer a distinção
quando devemos, mas a Escritura nem sempre faz esta distinção.
Por exemplo, em João 4:10, Jesus é ao mesmo tempo
alguém que pede água para beber, e alguém que dá água viva. Mas Jesus em sua natureza
divina não pode ficar com sede. Em Atos 3:15, Pedro diz aos judeus: “Vocês
mataram o autor da vida”. Mas Jesus em sua natureza divina não poderia ser
morto. Certamente, este não é um problema para a inspiração da Escritura, para
a deidade de Cristo ou para a doutrina da encarnação. Antes, é um testemunho do
fato de que a natureza divina e a natureza humana estão de fato intimamente
unidas em Cristo, e, todavia, ainda permanecem distinguíveis, de forma que não
há nenhuma mistura ou confusão. Uma não é divinizada, e a outra não é
humanizada.
De qualquer forma, é possível responder a objeção a
partir do próprio versículo. Observe que o envio dos profetas não é atribuído
ao “eu”; antes, somente a reunião dos filhos é assim atribuído. E visto que a
reunião está se referindo ao ministério sobre um nível humano e externo, isto
não demanda um assunto divino. O fato de que um ministério é resistido num
nível humano não diz nada sobre a soberania divina ou a liberdade humana sobre
um nível metafísico.
Embora possamos trazer à tona detalhes adicionais
para fortalecer o caso, nosso presente esforço foi mais do que suficiente. Já
mostramos que o versículo não concede nenhum suporte à heresia do Arminianismo,
e urgimos que seus aderentes abandonem seu pensamento humanístico para abraçar
a doutrina bíblica.
Nem pode o falso esquema do Calvinismo
inconsistente encontrar refúgio aqui, visto que nosso caso se aplica igualmente
contra eles e o uso impróprio deste versículo por eles, por exemplo, em seus
ensinos sobre a “oferta sincera” do evangelho e sobre a tensão entre os desejos
contraditórios na mente de Deus. Nós urgimos que os aderentes desta teologia
antibíblica abandonem seu irracionalismo, e finalmente removam todos os traços
da heresia Arminiana do seu pensamento.
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