segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

O ESTADO DA ALMA DEPOIS DA MORTE

1. A Doutrina Protestante

A Bíblia nunca fala que o homem tem algum outro corpo à parte de seu tabernáculo terreno e do corpo que há de possuir após a ressurreição. No entanto fala da alma como ativa e consciente quando está ausente no corpo e presente com o Senhor, e se a alma é uma substancia então ela possui poder, um poder de auto manifestação e um poder produtivo com base em sua natureza. A existência contínua da alma depois da morte é assunto à revelação divina. Constituía parte da fé da Igreja antes da vinda de Cristo. A revelação de todas as doutrinas que tratam dos destinos e salvação dos homens tem sido seguramente progressiva. Portanto, não deve surpreender-nos que a questão do estado futuro esteja muito menos desenvolvida no AT do que no NT. No entanto está ali. Quando Paulo (2Tm 1.10) se refere a “nosso Salvador Jesus Cristo, o qual aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade por meio do evangelho”, não se deve causar surpresa ao dizer que a vida futura era desconhecida.

Quando o texto bíblico de Gênesis 3.19 diz: “...tu és pó, e ao pó retornarás”. (RA). Entende-se que o substantivo feminino alma ou נֶפֶשׁ (nephesh) não pode ser visto como pó, mas sopro, sendo semelhante à espirito (i.e., alma e espirito são termos sinônimos – apresentam a mesma ideia, que é a composição imaterial do homem), e, portanto, segundo a teologia dos hebreus, não deveria voltar ao pó; mas a Deus que a dera. Consequentemente, descobrimos que, por todas as Escrituras veterotestamentárias, apresentam-se os mais elevados conceitos acerca da natureza e do destino do homem. Lemos continuamente no AT que os mortos vão para os pais, como que descendo ao “Sheol”, ou seja, ao estado invisível que os gregos chamavam Hades. O Sheol é apresentado como o receptáculo ou morada geral dos espíritos dos falecidos, os quais estão ali em estado de consciência; alguns deles em estado de desventura e outros, de bem aventurança. Em todos os pontos, a ideia pagã do Hades corresponde à ideia bíblica do Sheol. Todas as almas iam para o Hades, algumas morando no Tártaro e outras, no Elíseo. Os hebreus consideravam que a alma dos mortos tinham consciência e atividade, é coisa evidente por prática na necromancia, e confirmada pela aparição de Samuel e Saul, tal como registrada em 1 Samuel 28.

Devemos ter em mente que no NT há um comentário inspirado, e, portanto um comentário infalível das Escrituras veterotestamentárias. Com base neste comentário, aprendemos que o Velho Testamento contém
muito que de outra maneira já havíamos descoberto. E assim temos no NT as mais explícitas declarações não só de que estava revelada no AT a doutrina de um estado futuro, mas que ela desde o principio constituía parte da fé do povo de Deus.

Textos que reforçam esta ideia:

Atos 26.6-8 - “E, agora, estou aqui para ser julgado por causa da esperança da promessa feita por Deus a nossos pais. a qual as nossas doze tribos, servindo a Deus fervorosamente noite e dia, esperam alcançar; é por causa desta esperança, ó rei, que eu sou acusado pelos judeus. Por que é que se julga entre vós incrível que Deus ressuscite os mortos?”

A promessa a que ele se refere é a promessa de redenção por meio do Messias, redenção que inclui a libertação de seu povo do poder da morte e de outras más consequências do pecado. Esta era a promessa cujo cumprimento esperavam as doze tribos. Portanto, afirma-se que a crença em uma vida futura era parte de toda a religião hebreia.

Gálatas 3.8 - “Ora, a Escritura, prevendo que Deus havia de justificar pela fé os gentios, anunciou previamente a boa nova a Abraão...”

O evangelho, contudo, no sentido apostólico do termo, é a boa nova da salvação; e salvação é livramento da penalidade da lei e a restauração à imagem e ai favor de Deus, isso necessariamente envolve uma ideia de uma vida futura; de um estado futuro de miséria da qual a alma se torna livre, e de um estado futuro de glória e bem aventurança no qual ela foi introduzida.

Hebreus 11.13-16 - “Todos estes morreram na fé, sem terem alcançado as promessas; mas tendo-as visto e saudado, de longe, confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra. Ora, os que tais coisas dizem, mostram que estão buscando uma pátria. E se, na verdade, se lembrassem daquela donde haviam saído, teriam oportunidade de voltar. Mas agora desejam uma pátria melhor, isto é, a celestial. Pelo que também Deus não se envergonha deles, de ser chamado seu Deus, porque já lhes preparou uma cidade”.

Portanto, a fé dos santos Veterotestamentários no invisível e eterno era tão intensa como a de qualquer outro grupo de pessoas desde a criação. Pois o que eles disseram foram do Espírito Santo, então o que disseram foi o que Deus disse. Temos, pois, a firme palavra da inspiração que nos diz que o povo de Deus creu, desde o princípio, em um estado de existência consciente para além do túmulo. Não carece de argumento e ninguém discute que esta é a doutrina do Novo Testamento.

2. O Estado Intermediário

Assim como todos creem na ressurreição do corpo e no juízo futuro, também todos creem em um estado intermediário. Ou seja, creem que há um estado de existência entre morte e ressurreição, e que a condição dos mortos durante esse intervalo é diferente.

A Bíblia não ensina antropologia de maneira formal, nem na esfera da fisiologia nem na da psicologia como área de ciência humana, mas pressupõe muito do que subjaz a esses diversos ensinos. Pressupõem que a alma e o corpo são duas substancias ligadas em uma união vital para constituir o homem, no atual estado de existência, como uma pessoa individual. Pressupõe que a sede dessa personalidade é alma. A alma é o eu, o Ego, do qual o corpo é o órgão. Pressupõe que a alma continua sua existência consciente, bem sua capacidade de agir e de perceber ações, uma vez separada do corpo. Já vimos que essa é a doutrina da Bíblia inteira. Os mortos, segundo as Escrituras, não deixam de existir; não deixam de continuar conscientes e ativos.

Algumas considerações:

Nosso Senhor prometeu que ressuscitaria seu povo dos mortos no ultimo dia. Portanto, parece estar envolvido na natureza da redenção de Cristo, e da união entre seu povo, que, enquanto estiverem ausentes do corpo, estarão presentes no Senhor. É inconcebível que, habitando neles o Espírito de Deus, que é o Espírito de santidade e glória, mergulhem na morte em um estado de existência inferior àquele que desfrutavam neste mundo. Portanto, descobrimos que, na parábola do rico e Lázaro, Cristo diz: “Aconteceu que morreu o mendigo, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão” (Lc 16.22). Portanto é inegável que a implicação de que em seu caso a transição foi imediata da terra para o céu. Ainda mais explicita é a declaração de nosso Senhor ao ladrão penitente: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” (Lc 23.43). A palavra paraíso aparece em outras passagens no NT. Em 2 Coríntios 12.4, Paulo diz que foi arrebatado ao paraíso, o que explica dizendo que foi arrebatado até o terceiro céu. E em Apocalipse 2.7, Cristo diz: “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas. Ao vencedor, dar-lhe-ei que se alimente da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus”. Portanto, é indubitável que o paraíso é o céu, e, consequentemente, quando Cristo prometeu ao ladrão moribundo que naquele dia ele mesmo estaria no paraíso, a promessa é que ele estaria no céu. Portanto, parece impossível que todo aquele que não repousa sua fé nos pais, e sim, na Bíblia, possa negar que alma do crente, na morte, entra no céu.

A palavra céu é certamente um termo de tão ampla aplicação na Bíblia como vida diária. Falamos das aves do céu; das estrelas do céu; de nosso Pai que está no céu; e dos crentes como cidadãos do céu. Que o paraíso e céu não são a mesma coisa é mera disputa semântica. Se a palavra céu for tomada em um de seus sentidos legítimos, então é a mesma coisa; o Apóstolo, porém, diz que estão agora  εν τοις επουρανιοις (Ef 2.6), ou seja, no céu. O paraíso, como termo empregado por Cristo e seus Apóstolos, é o lugar onde Cristo está agora e donde se manifesta sua presença e glória. Que esse é o lugar onde finalmente ele estabelecerá seu reino, e que todos os redimidos, revestidos de seus corpos ressurretos, estarão reunidos ali.


Rev. Alfeu Magalhães.

Fonte: http://presbiterianoscalvinistas.blogspot.com/ 

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