“Cristão” significa
“pequeno cristo”. Que somos pequenos não há dúvidas. Em relação à
imensidão da história, nossa vida é como um milionésimo de segundo. Em
relação à imensidão do cosmo, se a nossa Via Láctea é um grão, o que
dirá da Terra e o que se dirá de nós? Ou seja, no tecido espaço-tempo
somos uma diminuta partícula. O problema, no entanto, é que além de
nossa finitude material, nos tornamos espiritualmente miseráveis ao
abandonarmos nosso Criador. Nos tornamos pessoas mesquinhas, arrogantes,
invejosas, vingativas.
Jesus é a revelação que
Deus tem misericórdia de nós, apesar de nossa pequenez moral. O
evangelho é o convite a seguir os passos de Jesus Cristo em direção à
cruz, para uma vida cheia de amor, alegria e paz. “Em Antioquia, os
discípulos foram pela primeira vez chamados cristãos” (Atos 11.26). Os
pequenos cristos são aqueles que continuam os passos de Jesus Cristo
hoje em Paris, Belo Horizonte, Tel Aviv, Detroit, Genebra, Luanda.
No início dos anos 2010
popularizou-se a noção de microrrevolução: no lugar de causas colossais,
propostas simples; em vez de ideologias lentas e previsíveis, mudanças
rápidas e pontuais. Em 2011 o evento TEDx na cidade de São Paulo
apresentou o termo assim: “Uma microrrevolução é uma mudança
significativa fomentada por ações simples. Quem reforma uma praça ou
monta um projeto de inclusão digital, por exemplo, fez uma
microrrevolução. Quem defende a agricultura urbana ou supera
dificuldades físicas por meio da arte também é um microrrevolucionário.
As microrrevoluções são sonhos possíveis, acontecem a todo momento, em
qualquer lugar”.
Creio que nesse tempo de
microrrevoluções, os pequenos cristos podem operar uma revolução ainda
mais precisa, ainda mais acurada: uma nanorrevolução em cada ato da
vida, até mesmo em nossos pensamentos e avaliações. Como disse o poeta
moçambicano Mia Couto em seu Poema didático: “Eu tive um país tão
pequeno, tão pequeno, que não cabia no mundo”[1].
O evangelho não é um
borrão conceitual, um credo enevoado. Pelo contrário: é mensagem
cristalina para uma vida cristalina. O evangelho é um convite para andar
na luz: o pleno reconhecimento de nossas limitações por um lado, mas
por outro, na imensidão do poder e do amor de Deus manifestos em Jesus
Cristo. E isso precisa ser colocado em atitudes concretas, pequenas
atitudes e gestos, como Jesus mesmo ensinou: até mesmo o simples
entregar de um copo de água fria!
Nestes tempo
líquido-gasosos caracterizados pela fluidez e instabilidade, sejamos
nanomissionários sólidos! Missão não é uma tarefa a realizar, é a
própria vida. Somos missão. “Antes mesmo de te formar no ventre materno,
eu te conheci; antes que saísses do seio eu te consagrei. Eu te
constituí profeta para as nações” (Jeremias 1.5).
A missão está sempre
relacionada com a concretude da existência. Não existe nenhuma missão no
abstrato, no vácuo, fora do tempo, do espaço e das culturas. A
revolução cristã é a missão de anunciar e viver o evangelho real! É um
processo de integração, de relação, de comunhão, de tolerância, de
urgência.
Concordo com João
Panazzolo: “missão é testemunhar, em todo o mundo, o que está
acontecendo em nós. É diferente de só realizar tarefas ou da ambição
expansionista. Manifesta-se em atividades, mas acontece primeiramente,
em nós” [2]. “Porque Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo,
para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em amor nos
predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo,
conforme o bom propósito da sua vontade, para o louvor da sua gloriosa
graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado” (Efésios 1.4-6).
A igreja está à serviço
do Reino, estabelecendo uma nova relação, uma reviravolta na hierarquia
do valores dominantes. O Reino é dos pequenos e simples e não dos sábios
e poderosos (Lucas 18.9-14). Foram esses pequenos cristos que
difundiram a mensagem de Jesus! Como afirmou John M. Kelly, a fé cristã
alcançou “não só a plebe urbana (que se sentia especialmente atraída
pela mensagem de Cristo), mas também membros das classes superiores
educadas, que logo se tornaram capazes de opor ao paganismo argumentos
intelectuais vencedores”[3].
A fé cristã vai direto
ao ponto. Apresenta respostas incisivas e claras às grandes questões da
vida. Apresenta preceitos diretos, sem embromação. Como afirmou Blaise
Pascal: “Duas leis bastam para reger toda a República cristã, melhor do
que todas as leis políticas”[4]. Os pequenos cristos são cidadãos do
Reino do Amor.
Conforme o texto do
Evangelho segundo São João 3.16 “Porque Deus amou tanto o mundo que
enviou seu filho unigênito para que todo aquele que nele crer não
pereça, mas tenha a vida eterna”. Lutero chamou esse trecho bíblico de
“evangelho em miniatura”. E é exatamente isso o que precisamos hoje:
miniaturas de Jesus em circulação, miniaturas do evangelho, pequenos
cristos por toda parte.
Por Davi Lago
NOTAS
[1] COUTO, Mia. Poemas escolhidos. São Paulo: Companhia das Letras, 2016, p.153.
[2] PANAZZOLO, João. Missão para todos: introdução à missiologia. São Paulo: Paulus, 2006, p.101.
[3] KELLY, John M. Uma breve história da teoria do direito ocidental. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010, p.108-109.
[4] PASCAL, Blaise. Pensamentos. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p.143.
Fonte: http://ministeriobbereia.blogspot.com
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